
O famoso ‘cafezinho’ está presente na vida da grande maioria dos brasileiros e a paixão do Brasil pela bebida se comprova tanto na rotina, como também nos números do setor. Porém, conforme as inovações adentram no mercado cafeeiro, novas perspectivas e tendências surgem, dentre elas, o crescimento no consumo e interesse nos chamados “cafés especiais”.
De acordo com levantamento divulgado pelo Sebrae, em setembro deste ano, através de dados da empresa de consultoria Euromonitor, o Brasil é o segundo maior consumidor de café (13%), ficando atrás apenas dos Estados Unidos (14%). Por ora, quando se trata de produção, o setor brasileiro assume a liderança absoluta há décadas. Em 2023, aproximadamente 58 milhões de sacas de 60 quilogramas (kg) foram produzidas, equivalendo a 34% da fabricação global, de acordo com o Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa).
No entanto, desde abril de 2025, quando o presidente americano Donald Trump anunciou o “tarifaço” de 50% sobre uma série de produtos brasileiros, diversos insumos e commodities foram impactados, incluindo o café. Além da disparada no preço do grão, o consumidor final também sentiu a alta no valor da bebida. Segundo a Associação Brasileira da Indústria de Café (Abic), em agosto de 2025, o quilo do café quase dobrou no comparativo a dois anos atrás, saindo de R$32,40 para R$62,83.
“(…) Quando você tem menos café brasileiro, você tem menos café no mundo também, e por consequência, a alta nos preços”.
Gil Barabach, economista e consultor de Safras & Mercado.
Para além do tarifaço estadunidense, fatores climáticos são um ponto importante no encarecimento da bebida. “Em 2021 tivemos uma forte geada e, em seguida, longos períodos de seca. O mais problemático é que esses episódios afetaram regiões que são o ‘coração’ da produção de café no Brasil, como São Paulo e principalmente Minas Gerais. Quando você tem menos café brasileiro, você tem menos café no mundo também, e por consequência, a alta nos preços”, explica o economista e consultor de Safras & Mercado, Gil Barabach.
Mas apesar da disparada no preço do café enquanto commodity, a indústria de grãos especiais registra crescimento. No mesmo estudo do Sebrae, mencionado anteriormente, foi revelado que o consumo anual de café especial no Brasil se dá em aproximadamente 70 mil toneladas, o que representa de 5% a 10% da demanda total do setor. E as projeções comprovam a crescente popularidade desses grãos: enquanto a busca pelo cafezinho tradicional amplia em 3,5% ao ano, os cafés especiais registram aumento anual de 15%.
Conhecidos por terem grãos isentos de defeitos e com alta pontuação em quesitos como aroma e acidez, tais cafés seguem padrões rígidos de produção, e possuem até uma classificação singular para aferir a qualidade – escala definida pela Specialty Coffe Association (SCA), organização pioneira na comunidade global de cafés especiais.
Dos desafios surgem as tendências de mercado
Buscando mais qualidade e uma melhor experiência, o mesmo estudo identificou dois principais perfis de consumidores de cafés especiais: os chamados “Coffee Lovers” e os clientes de varejo. O primeiro tipo são pessoas que vão até cafeterias, buscando um bom ambiente e um conceito por trás do produto. Enquanto isso, o segundo se refere a consumidores que compram o café especial através do setor varejista, seja por grandes redes de mercado ou até mesmo pela internet.
Analisando respectivamente aspectos como classe social e faixa etária, o público dominante nesse mercado são consumidores que pertencem à classe B (50%) e com idade acima de 40 anos (40%). Ainda, observando por regiões do país, a maior parte dos clientes se concentram na região Sudeste (45%), Nordeste (22%) e Sul (17%). Quanto ao gênero, 50% são formados por homens e 50% por mulheres.
No entanto, apesar da busca por cafés especiais ainda se dar, em maioria, por consumidores tradicionais, o jovem adulto – entre 18 e 30 anos – não fica muito atrás (35%). A presença da bebida no cotidiano desse público pode ser atrelada à introdução de cafeterias especializadas nesse ramo dos grãos ‘premium’.
“Há alguns anos tínhamos uma barreira muito grande com o público jovem, pois eles não se viam sensibilizados ao consumo de café. E um dos fatores que ajudaram a quebrar essa dificuldade foi a crescente de cafeterias, que são espaços que acabam criando esse ambiente propício ao consumo de novos formatos, como as cápsulas e, claro, os cafés especiais”, enfatiza Barabach.
O grão que une duas pontas: a produção e o comércio de cafés especiais no Paraná
Quando se fala em produção de café, o Paraná é destaque nas estatísticas, sobretudo nas regiões Norte Pioneiro e Norte Central. De acordo com a Federação da Agricultura do Estado do Paraná (FAEP), a produção cafeeira é estimada em 741,8 mil sacas, com cultivo predominante do café arábica. Ao olhar para os cafés especiais, 15% a 20% da produção paranaense são destinados para esse cultivo.
“É gratificante estar vendo o nosso café nas melhores cafeterias, tanto aqui [no Brasil] quanto no exterior”.
Marcelo Valdevino da Luz, produtor paranaense de cafés especiais.
Marcelo Valdevino da Luz é produtor especializado em grãos especiais no município de Carlópolis, localizado no Norte Pioneiro paranaense, e representa a terceira geração à frente do Sítio Teixeira, fazenda da família voltada à produção. “É gratificante estar vendo o nosso café nas melhores cafeterias, tanto aqui [no Brasil] quanto no exterior. Isso agrega muito valor ao nosso produto e ao trabalho, assim conseguimos ‘segurar os trilhos’ com os custos e manter uma produção de qualidade”, conta.

Saindo da produção e indo para a vida urbana, o crescimento de comércios especializados em cafés especiais e das cafeterias “gourmets” ampliaram a cultura cafeeira em Curitiba. Além disso, o conhecimento técnico sobre o produto também é uma vantagem da capital paranaense.
“Anualmente, o consumo de café especial em Curitiba tem crescido em média de 8% a 15% por ano desde 2008, e isso também é resultado da constante busca por parte dos profissionais da área em aprender mais sobre a própria bebida”, explica Paulo Poran, comerciante de cafés especiais e um dos baristas mais experientes da cena curitibana.
“(…) Então quando a gente fala de café especial, também falamos desse processo de trazer ao cliente a experiência completa, da fazenda até a xícara”.
Paulo Poran, barista e comerciante de cafés especiais em Curitiba.
Poran ainda destaca o papel do barista como um importante ator na promoção da cultura do café. Segundo ele, “muitos baristas são mais jovens e desde cedo acabam difundindo esse conhecimento para outros jovens, que era um público que antes não conseguíamos alcançar. Em Curitiba esse foi um trabalho pioneiro e de ‘formiguinha’, e atualmente a cidade conta com grandes nomes do barismo. Então quando a gente fala de café especial, também falamos desse processo de trazer ao cliente a experiência completa, da fazenda até a xícara.”
Curitiba: a capital dos cafés “To Go”
Desde 2020, Curitiba é considerada a “capital dos cafés especiais” e o impulsionamento do setor e as inovações na maneira de se vender e consumir café, tornaram a capital paranaense um espaço precursor para as chamadas franquias to go. Provavelmente ao andar pela cidade você já se deparou com cafeterias pequenas, ágeis e sem necessariamente um espaço para consumir no local – pois bem, esse é o modelo de negócio chamado to go, ou melhor, “para levar”.
Atualmente, três grandes empresas do ramo nasceram na capital: The Coffee, Go Coffee e Mais1.Café. Conhecidas pelo baixo custo de operação, o preço do café nestas cafeterias tende a ser mais barato, atraindo um público maior e contribuindo cada vez mais para o crescimento do setor. A The Coffee possui cerca de 255 lojas no Brasil, além de unidades no exterior. Enquanto isso, Go Coffee alcançou no último mês 550 unidades no país e a Mais1.Café é líder no setor, com aproximadamente 600 unidades espalhadas por 25 estados brasileiros.




