Benefício pago a famílias de presos ainda gera polêmica

Entre 1990 e 2012, o número de presos no Brasil subiu 511% de acordo com dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen). Sendo assim, cresce também o número de famílias que perdem, com a prisão de um integrante, uma parcela da fonte de renda. O auxílio reclusão tem o objetivo de garantir aos dependentes dos presos o mínimo de estabilidade para que a situação da família não piore. Mas a distribuição desse benefício ainda é marcada por muito desconhecimento por parte da sociedade.

O auxílio reclusão é um benefício mensal pago à família de reclusos em regime fechado ou semiaberto oferecido pelo Instituto Nacional do Seguro Nacional (INSS). Segundo o último relatório da Previdência Social, de outubro deste ano, o INSS pagou quase R$2 milhões em auxílio reclusão, o que representa 0,5% do gasto total com benefícios previdenciários.

Os dependentes diretos dos presos – filhos, cônjuge, pais e irmão com menos de 21 anos – tem direito ao benefício e recebem, em média, R$ 872,42. Em caso de mais de um dependente, esse valor é dividido.  O cálculo para determinar o valor auxílio segue a regra dos outros benefícios do INSS. É uma média com os salários de contribuição do preso. Ainda de acordo com a regra vigente, o último salário recebido pelo detento não pode ter sido superior à R$1025,81.

Cibele e Caik recebem o benefício há um ano. Sem ele, segundo Cibele, os dois iriam “passar necessidade” / Foto: Thais Barbosa

O filho de Cibele Machado, assistente comercial, recebe o benefício há um ano. O primeiro contato de Cibele com o auxílio reclusão foi através dos apelidos. “Eu ouvia o pessoal falando que os presos recebiam salário, uma ‘bolsa bandido’. Mas quando o pai do Caik foi preso e não podia mais pagar a pensão alimentícia, fui pesquisar sobre o auxílio reclusão e percebi que aquelas expressões eram puro preconceito”, conta Machado.

Para sustentar o filho, Caik, Cibele, então, recorreu ao auxílio reclusão. No INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), Cibele teve que apresentar uma série de documentos comprovando a paternidade e a impossibilidade de trabalho, devido à reclusão, do pai de Caik.

A assistente comercial demorou 40 dias para conseguir todos os documentos necessários e, de três em três meses, ainda precisa encaminhar um documento ao INSS comprovando que o pai de Caik continua preso em regime fechado. “Graças ao benefício, consigo dar uma vida melhor para o meu filho. Com o auxílio, eu pago a escola, lanche, brinquedo, roupas… É um alívio para mim e para o pai dele, que está preso mas sabe que o filho está bem”, completa Machado.

Processo

A coordenadora do Programa de Educação Previdênciário da Previdência Social, Teresinha Marfurte, diz que a grande exigência de documentos garante a baixa incidência de fraudes envolvendo o benefício. Marfurte ainda explica que o benefício não pode ser destinado a quem já recebe outro benefício do INSS, como aposentados, pensionistas ou quem recebe auxílios saúde ou invalidez.

Segundo a coordenadora, o processo é acompanhado e em caso de fuga ou mudança de regime – de fechado ou semiaberto para aberto – o benefício é suspenso. “O auxílio diminui a vulnerabilidade social da família presos e, por consequência, evita novos crimes. É um benefício que, como qualquer um, faz falta. Ele não é assistencial, ele serve para proteger e amparar o segurado.”

O auxílio reclusão tem o objetivo de garantir aos dependentes dos presos o mínimo de estabilidade para que a situação da família não piore / Foto: Rafael Andrade

Falta de informação

A assistente social da Penitenciária de Piraquara, Juvanira Mendes, lamenta que a falta de informação propague a ideia de que o auxílio reclusão é um favor à família do preso. “O auxílio reclusão é um direito trabalhista. O preso trabalhou, então, contribuiu para o INSS. É direito dele ter uma retribuição desse valor e que isso seja repassado para os dependentes”, diz  Mendes.

Ela ainda explica que a assistência social orienta internamente os presos sobre as políticas públicas as quais os detentos têm direitos. Mendes reforça que o direito ao benefício é gratuito e pode ser conseguido sem um advogado.

Em algumas unidades, a assistência ajuda, ainda, na questão documental. “A cada 90 dias, a penitenciária tem que emitir um documento provando que o preso ainda está recluso. Através da defensoria, conseguimos orientar melhor a família sobre esse processo e os auxiliar nesse trâmite”, conta a assistente.

Mudança

Carla Pimentel, vereadora de Curitiba, é contra o auxilio reclusão como ele está posto. Segundo ela, o auxilio compromete uma parcela do orçamento da União que poderia ser usada para outros investimentos, como a saúde.

O auxilio, segundo ela, prevê uma incapacidade de trabalho questionável.  “Eu entendo que o trabalho edifica. Eu defendo que o preso continue trabalhando dentro dos presídios para que possa pagar a manutenção dele dentro da prisão, protegendo o cidadão de pagar essa conta”, opina Pimentel. A vereadora ainda defende que o benefício seja substituído por cursos profissionalizantes às famílias.

Pimentel propõe uma reforma no sistema penitenciário como um todo que, entre outras coisas, aumente o numero de presos trabalhando. Com o salário, Pimentel defende que o preso deve arcar com as despesas da prisão e que, dessa forma, esse valor deixe de ser pago pelo Estado. “Além disso, uma parte do dinheiro será destinada a um fundo no qual o preso só terá acesso depois de solto, para um investimento em algum projeto empreendedor”, defende a vereadora.

Quem tem direito ao benefício?

  1. Cônjuge, companheiro ou companheira (incluindo casal homossexual que comprove união estável)
  2. Filho não emancipado, até 21 anos de idade, ou filho inválido de qualquer idade.
  3. Pais
  4. Irmão não emancipado, de qualquer condição, até 21 anos de idade.

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