Iluminação em Curitiba mostra onde a segurança da cidade não chega

Dados mostram queda de 46% nos roubos, mas socióloga alerta que benefícios não são para todos.

Rua Conselheiro Araújo – Centro. Curitiba, 23/07/2025 Foto: Alan Bezerra/ acervo

O programa “Ilumina Paraná” do governo do Estado do Paraná, com investimento de R$ 300 milhões, já reduziu 46% dos roubos e 29% dos homicídios nas áreas contempladas (Boqueirão, Alto Boqueirão e Bairro Alto). Especialista em segurança pública, Bhranda Oliveira, alerta que impacto social vai além dos números, afetando especialmente mulheres e moradores de periferias. 

Lançada em fevereiro deste ano, a iniciativa já apresenta resultados divulgados pela Secretaria de Estado da Segurança Pública do Paraná (SESP/PR): redução de 15% em casos de violência sexual e 16% nos feminicídios em áreas onde as novas lâmpadas de diodo emissor de luz (LED) foram instaladas. Até o momento, 66% das luminárias sob gestão da Copel foram substituídas. 

Rua Francisco Torres – Centro. Curitiba, 29/07/2025. Foto: Daniel Castellano/SMCS

O secretário de Estado das Cidades, Guto Silva, confirmou os investimentos, reforçando a meta de alcançar 100% dos municípios paranaenses com iluminação de LED. “O bandido é como um morcego, não gosta de claridade, mas sim de escuridão. Uma cidade bem iluminada ajuda na segurança pública, no trabalho da nossa Polícia Militar.” afirmou o secretário. 

Para a mestre em Ciência Sociais e pós-graduanda em Segurança Pública, Bhranda Oliveira, os dados quantitativos representam apenas parte da realidade. “Quando falamos de iluminação pública, estamos falando de dignidade e acesso aos direitos. Nós não passamos por lugares escuros. Se a gente vê um cara na rua atrás da gente, principalmente numa rua escura, a gente não se sente confortável, se sente ameaçada.”. A pesquisadora ainda destaca que o impacto é particularmente significativo para mulheres: “Por mais empoderada que eu seja, eu senti muito medo pelo fato de eu ser mulher. E é uma rua escura, então eu não me sentia segura”. 

“Por mais empoderada que eu seja, eu senti muito medo pelo fato de eu ser mulher. E é uma rua escura, então eu não me sentia segura”. 

Bhranda Oliveira, pós-graduanda em Segurança Pública
Rua Rio vila Guaíra – Parolin. Curitiba, 29/07/2025. Foto: Pedro Ribas/SMCS

Em Curitiba, a gestão é realizada por meio do Contrato de Concessão Administrativa n° 25.297, celebrado entre o município e a concessionária Engie Soluções. O Plano Diretor de Iluminação Pública da cidade, publicado em 2021, estabelece metas e parâmetros técnicos para uniformizar a qualidade do serviço em todo o município, priorizando a eficiência energética e a segurança. Conforme explicitado no próprio plano, o documento atua como uma diretriz geral para a concessão e não elabora um diagnóstico detalhado da situação de cada bairro em particular. 

Apesar dos avanços, a socióloga observa disparidades na distribuição dos benefícios. “Os bairros de classe média alta geralmente são mais tranquilos de se morar porque tem iluminação, tem pavimentação. Mas os bairros mais periféricos são bairros onde esse investimento não chega. Consequentemente, há uma associação social de que aquele bairro é perigoso”. 

O técnico em eletrônica, Carlos Eduardo Moraes, experimentou na pele a diferença que a iluminação pública exerce sobre a rotina dos cidadãos. “Voltando do trabalho para casa, no Boqueirão, sempre evitava a Rua da Paz porque é sempre um breu. Na semana passada, estava atrasado e resolvi arriscar. Dito e feito: dois homens me abordaram, quase não enxerguei os rostos. Levaram meu celular e a carteira. Se a rua estivesse iluminada, talvez tivessem pensado duas vezes antes de agir”, relata. 

Oliveira levanta outro ponto crucial ao questionar a viabilidade de se instalar câmeras de segurança, como as 360 planejadas para a cidade, em vias com iluminação precária, condição que afeta 80% do município, segundo a  especialista.

O secretário de Estado da Segurança, Hudson Leôncio Teixeira, é enfático: “A segurança pública não se faz só com policiamento, só com viatura na rua, depende de toda uma infraestrutura que não permita que o crime aconteça”. Para a mestre em Segurança Pública, o sucesso final será medo pela equidade: “A iluminação pública é uma política pública porque você está garantindo diversos acessos às pessoas, principalmente o direito de ir e vir em segurança”.

Enquanto o estado celebra os resultados, Curitiba segue o desafio de garantir que a luz da modernização ilumine igualmente todas as suas esquinas, das centrais às periféricas, transformando números positivos em experiências reais de segurança para todos os moradores. O alerta de Bhranda Oliveira serve como guia para os gestores: a verdadeira iluminação não é apenas a que afasta os criminosos, mas a que garante dignidade igualitária a todos os cidadãos. 

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