Programa Mais Médicos não reestrutura a atenção primária de Curitiba

O Sistema Único de Saúde de Curitiba (SUS) possui, hoje, 109 unidades básicas de pronto atendimento, 2 hospitais voltados à atenção primária e 12 centros de atenção psicosocial. Entretanto, os 700 médicos presentes nas unidades de saúde não conseguem suprir a demanda da cidade. O déficit crônico de 80 médicos na atenção primária exigiu da Secretaria de Saúde requisitar, em caráter emergencial, a abertura de um processo seletivo de vagas temporárias através do requerimento de 21 novos profissionais pelo Programa “Mais Médicos” do Ministério da Saúde. A cidade apresenta a menor carga horária de atendimento dos últimos quatro anos, apesar de estar oferecendo mais consultas.

Entretanto, a primeira etapa do processo trouxe à capital apenas seis novos médicos. Segundo o membro da Comissão Pedagógica do Ministério da Saúde para o Programa “Mais Médicos” Francisco Mouzinho, muitos médicos brasileiros inscritos no programa desistiram devido à falta de costume com a atenção básica. “Muitos só se inscreveram pelo salário, sem conhecimento da situação. O Ministério da Saúde irá supervisionar para que não ocorra mais exploração, mas haverá mais baixas”, afirma o Mouzinho. Os lugares que não foram ocupados serão preenchidos através do serviço de terceirização firmado pela cooperação internacional com Cuba.

Em caráter emergencial, 21 novos profissionais atenderão 17 unidades de Curitiba

Segundo o diretor do departamento de atenção primária de Curitiba Paulo Poli, a vinda de novos médicos não garante a consolidação do sistema na cidade. Para ele, é necessário rever, primeiro, o fraco caráter resolutivo das unidades de saúde. “As unidades devem abrir as portas ao pacientes, executar mais serviços, receber mais treinamento”, diz. Atualmente, as unidades básicas trabalham apenas com consulta agendada e sem atenção especializada.

Etapas do Projeto

O Ministério da Saúde criou, no final de 2012, uma comissão de especialistas para avaliar o cenário da atenção básica no Brasil, bem como as dificuldades e medidas cabíveis ao processo de reposição temporária de profissionais. Segundo Mouzinho, a conclusão foi que somente em 2035 o país atingiria o número ideal de médicos para garantir pleno atendimento do SUS.

A primeira medida tomada para resolução foi a instituição do Programa de Valorização da Atuação Básica (Provab). O objetivo era recrutar médicos recém- formados dispostos a atender regiões de difícil provimento, sob a tutela de um professor, enquanto receberiam um curso de especialização à distância. Porém, mesmo com o aumento salarial (R$8 mil) proposto na segunda fase do projeto, o número de aprovados não supriu a necessidade do país.

Na segunda etapa, o governo federal realizou um chamamento internacional, com a ideia de facilitar a entrada de profissionais estrangeiros com salário equivalente aos médicos brasileiros provenientes do Provab. “Ainda assim a comissão percebeu que o número necessário não seria preenchido, muitos profissionais desistiram por não conhecerem a realidade brasileira. Os que ficaram foram direcionados às cidades de mais fácil acesso”, explica Mouzinho.

Deste modo, em caráter emergencial, surgiu a proposta de terceirizar o serviço para as cidades ainda desprovidas de atendimento. Assim, o ministro da saúde, Alexandre Padilha, assinou um termo de cooperação internacional com a Organização Panamericana de Saúde (Opas), para a contratação de 6 mil médicos cubanos e preenchimento das vagas restantes.

Por que Cuba?

Segundo o médico Mouzinho, o Brasil é signatário de um acordo internacional que proíbe o governo federal de contratar países com proporção de médicos igual ou inferior ao presente no território nacional. Isso quer dizer que, para a terceirização do serviço, só estava apto a serem contratados países que, proporcionalmente, apresentassem um número maior de médicos que o montante brasileiro. “Cuba era um dos únicos países que se enquadravam”, concluiu.

Além disso, as universidades cubanas possuem departamentos especiais para Missão. Os médicos do país já possuem uma formação à missão, uma vez que são atuantes em organizações internacionais para a saúde como o Médicos sem Fronteiras. Os profissionais já atuaram diretamente no Haiti, Paquistão e na região central da África. O financiamento para estas missões vem diretamente da contratação  por tempo limitado, como fez a Venezuela e como está fazendo o Brasil.

No contraponto, a Federação Nacional de Médicos (Fenam) acredita que o modelo do contrato não dá aos cubanos os direitos previstos na legislação trabalhista brasileira, uma vez que parte de seu salário será repassado à Organização Panamericana da Saúde. O Ministério Público Federal do Distrito Federal já abriu uma investigação para avaliar o caso.

Preparação

Os médicos passarão por 3 semanas de curso em oito capitais brasileiras, avaliações de idioma e simulações de consulta em português. Os que vieram ao Paraná foram treinados no Rio de Janeiro. Por enquanto, 30 novos profissionais serão distribuídos em 19 municípios do estado. Segundo Fernando Mouzinho, os dois mil primeiros médicos que estão chegando no Brasil são ótimo profissionais. “Eles já falam português e já possuem residência. Além de terem plena consciência da situação que encontrarão no Brasil”, finaliza.

 

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