Projeto Vivendo O Rugby retorna às atividades presenciais

Crianças que só conheciam o rugby pelas telas poderão ter contato presencial com esporte. Expectativa é que projeto atenda até 600 crianças neste ano.

rugby crianças

Após dois anos de suspensão das atividades presenciais por conta da pandemia, o projeto Vivendo o Rugby (VOR) está retornando às atividades normais. Este ano serão atendidas cinco escolas e Centro de Assistência e Desenvolvimento Integral (Cadi) de Fazenda Rio Grande. O coordenador do projeto, Victor Ancina, conta que neste período inicial estão sendo feitas as divulgações do VOR nas escolas e a expectativa é de que em 2022 cerca de 600 crianças possam ser atendidas. 

O VOR é uma iniciativa dos jogadores do time Curitiba Rugby para ensinar o esporte para crianças de escolas públicas no contraturno. O projeto foca no desenvolvimento cidadão, com o objetivo de que os participantes aprendam e desenvolvam os valores do rugby, como explica o coordenador: “O rugby é muito mais que jogar por jogar, é uma continuidade, tem a questão do espírito esportivo, da solidariedade, disciplina e paixão. Tudo isso faz parte da nossa metodologia.”

Iniciativa de atletas do Curitiba Rugby ensina rugby para crianças de escolas públicas no contraturno (Victor Ancina/Arquivo pessoal)

Antes da pandemia, o projeto acontecia em dois ambientes: nas escolas e no campo onde treina o Curitiba Rugby, no Capão da Imbuia. Quando as atividades eram no campo, as crianças sempre contavam com o acompanhamento de alguns professores, mas este ano a verba da Secretaria Municipal de Educação, que paga esta hora de trabalho dos professores, ainda não foi liberada. “Então estamos funcionando pela metade”, explica o coordenador do projeto, que completa: “Não está tendo essa prática no campo de rugby que é o ponto forte do nosso projeto”.

Melhor do mundo

Durante o período de hiato, o projeto não parou. Foi desenvolvida uma campanha solidária, na qual foram arrecadadas doações que somaram mais de 600 cestas básicas para auxiliar famílias de crianças e adolescentes que estavam matriculados no projeto. Vitor explica a iniciativa: “Não focamos muito em rendimento e treino porque tinha muita gente precisando dessa assistência”. Também foram feitas movimentações nas redes sociais com vídeos sugerindo brincadeiras para fazer em casa. João Pedro, de 17 anos, estava no festival, e conta que fazia as atividades dos vídeos remotamente. Ele começou jogando com o VOR aos 13 anos e hoje está na seleção juvenil do time. A determinação de João nasceu com uma inspiração: “Minha tia trabalhava no restaurante de uma jogadora de rugby da seleção, e ela me falava para eu não parar, não parar que eu ia longe. Agora eu tô aqui”.

Os vídeos (ver abaixo) tinham como objetivo não deixar que as crianças se afastassem da vivência do rugby enquanto estavam longe do campo.

Para outros participantes do VOR, não é necessário olhar para fora do projeto para encontrar inspirações. O professor do projeto Marcelo Pereira já foi aluno também e apontou em quem se espelhou: “O Victor Ancina foi meu primeiro professor. Eu olhava pra ele e pensava: ‘Nossa quero ser igual a esse cara. É isso que eu quero fazer da minha vida’”. E o legado foi passado adiante: “Depois que comecei a trabalhar no VOR, já teve crianças que vieram e falaram: ‘Ah quando eu crescer eu quero ser igual você’. Esse tipo de coisa faz a gente ganhar o mês, o ano, o dia…”.

O projeto é reconhecido internacionalmente e foi premiado como o melhor projeto de rugby do mundo pela World Rugby, em 2014. A coordenadora da época, Leca Jentzsch, foi a Londres receber o troféu graças ao peso social do projeto.

Inicialmente, os objetivos eram outros. A escassez de jogadores para o time do Curitiba Rugby era um problema no início dos anos 2000, e a solução encontrada foi apresentar o rugby nas escolas. “Depois percebemos que podia se desenvolver algo a mais com isso”, diz Ancina. “O pessoal foi atrás de criar uma lei de incentivo ao esporte para desenvolver um projeto com uma estrutura boa e que atendesse o maior número de crianças”, complementa. Em 2013, o projeto foi aprovado e consolidou a iniciativa que já existia desde 2007.

Atividades com crianças acontecem nas escolas e no campo do bairro Capão da Imbuia, onde treina o Curitiba Rugby

Primeiros contatos

O primeiro e único contato presencial desde março de 2020 aconteceu ainda em novembro do ano passado, com a 18º edição do Festival Interescolar de Rugby. O evento foi pontual e contou com medidas de proteção contra a covid-19, como máscaras, higienização de equipamentos e medidas de distanciamento social. Os jogos aconteceram no campo onde costumavam ser os treinos com as crianças. O evento recebeu três escolas municipais e o CADI de Fazenda Rio Grande, somando cerca de 150 crianças. As escolas participantes foram Wanderley Dias, Herley Mehl e Coronel Durival de Britto e Silva. Eventos do tipo já chegaram a atender 800 crianças antes do início da pandemia.

Para a segurança sanitária das crianças, os jogos aconteceram na modalidade Tag rugby, muito usada em aulas de educação física para iniciar os alunos no esporte. No formato, a quantidade de contato diminui porque o tackle, movimento de derrubar o jogador do time adversário, é substituído. Todos os jogadores usam fitas penduradas na cintura e para parar o oponente ou tomar a bola é necessário arrancar uma fita do cinto. Essa ação substitui o tackle e é chamada de “tag”, devendo ser acompanhada do aviso em voz alta de quem tirou a fita. O coordenador do projeto comenta: “O VOR abre as portas. Através de jogos e brincadeiras você aprende a desenvolver o rugby e o TAG tem muito disso”.

Quando perguntados sobre a mudança de modalidade, alguns alunos disseram adorar, como é o caso do Guilherme, de 9 anos, que acha o TAG a parte mais legal do esporte. Já Heloísa, de 14 anos, pensa diferente: “Não gosto do TAG porque minha parte preferida é o tackle, mas como estamos na pandemia não dá”.

Um espaço de desafios foi montado, onde as crianças deveriam jogar a bola por cima do “H” e acertar dentro de uma caixa d’àgua vazia do outro lado. Todos que acertaram ganharam medalhas.

“A gente pretendia fazer um dia bem divertido pra eles. Não tem foco em competição. a ideia é que todo mundo está lá para se divertir e respeitar o adversário. A gente se preocupa se a pessoa desrespeita alguém, se cai no chão e não levanta. Pô, caiu no chão, levanta o mais rápido possível, assim como na vida. Desenvolver emoções também. ‘Tá sentindo raiva ou tristeza porque perdeu? então vamos tentar entender de onde vem o sentimento”

Victor Ancina, coordenador do projeto Vivendo o Rugby

O aprendizado de tais valores aparece no discurso das dos alunos, como o de Pedro Henrique, de 9 anos: “Gosto de jogar e assistir meus amigos ganhar… Às vezes perder, mas é assim mesmo. Às vezes ganhou, às vezes perdeu. Acontece”. O estudante conheceu o Rugby durante a pandemia e afirma não saber muita coisa sobre ainda. Esse é o caso de vários participantes do festival, que o tiveram como o primeiro contato “pra valer” com o rugby. Foi uma tarde de começos e reencontros.

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