Skatistas pedem reativação de pista da Praça da Ucrânia

Inicialmente usada por patinadores, pista é considerada a mais antiga do Brasil

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Skatistas de Curitiba reúnem-se em um movimento para reativar a pista da Praça da Ucrânia, no bairro Bigorrilho, soterrada em 1999 sob o pretexto de baderna. Hoje, sobre a primeira pista do gênero no Brasil, inicialmente usada por patinadores, está um canteiro de mato. A praça, antes movimentada pelo vai e vem dos skates, agora só vê transeuntes em dias de feira. Reina o abandono. 

O empresário Dax Senden estava presente no dia do “enterro”. À época com cerca de 13 anos, viu jogarem um caminhão de areia na pista e em seus sonhos: “Fui lá com um amigo, fazendo o mesmo caminho que fazíamos todos os dias. Eu saia do colégio e só pegava o skate, ia pra lá, era lá que tinha, o nosso ambiente social, nosso ambiente de saúde e de brincadeiras. E naquele dia a gente se sentiu impotente vendo os caminhões de terra, um atrás do outro, soterrando aquilo que era um símbolo tão importante pra nós. Machucou muito o coração. Parecia que junto com a pista estavam de fato enterrando um pedaço da gente.” 

Um dos idealizadores do movimento, o analista jurídico Luís Fernando Toledo, afirma que a pista foi enterrada sem nenhuma justificativa plausível. Ao contatar a prefeitura na época do soterramento, ouviu que o motivo da ação era a presença de pessoas na praça escutando música alta durante a madrugada. De acordo com Toledo, no entanto, não eram os frequentadores da pista que ocupavam a praça dessa forma. “Até os dias atuais, o verdadeiro motivo para desativarem a pista é desconhecido por todos os ex-frequentadores da Praça. Se realmente fosse a presença de um grupo que frequentava o local de madrugada, com som alto, a Prefeitura de Curitiba poderia ter adotado outras medidas, como limitar o horário de funcionamento da pista, ou, até mesmo, determinar que policiais comparecessem até o local para verificar os fatos. Entretanto, determinaram, de imediato, que substituíssem a pista por um canteiro de flores”, explica o skatista.

Na época do fechamento da pista, a prefeitura se comprometeu a criar outra em local próximo. Foi escolhido para o novo empreendimento o Clube Juventus, mas a construção nunca aconteceu. Hoje, a pista mais próxima fica a três quilômetros dali. Foto: Pás na Ucrânia

Pás na Ucrânia

Passados 22 anos, Toledo busca respostas e está motivado a resgatar o espaço histórico do skate em Curitiba e no Brasil. Pensando nisso, criou o movimento Pás na Ucrânia para desenterrar legalmente a pista. A ideia é chamar a atenção do poder público para os benefícios da prática do skate e da reativação do local, inaugurado em 1967 pelo então prefeito Omar Sabbag na praça criada em homenagem ao poeta ucraniano Taras Chevtchenki. 

Em documento enviado à Secretaria do Meio Ambiente, responsável pelas praças e parques de Curitiba, o grupo de skatistas elenca motivos para a reativação da pista. A ação traria segurança para a praça que, por permanecer vazia, é palco frequente de assaltos. Curitiba estaria, ainda, exercendo seu papel social, fomentando o esporte e reavivando um local histórico. 

Para a prefeitura, no entanto, a reativação da pista não é factível. Em resposta ao documento, a Secretaria do Meio Ambiente alega que a pista foi fechada por causa do ruído dos skates que chegava com mais potência nos andares mais altos dos prédios do entorno. Nos chamados  “cânions urbanos” formados pelos paredões dos prédios, ocorre a reverberação e amplificação de ondas sonoras, incomodando os moradores. 

Toledo discorda: “Eles foram ríspidos desde o começo dizendo que era impossível. Nem deixaram a gente falar direito. É um documento baseado em argumentos de 20 anos atrás”. Prevendo a alegação do barulho, o grupo afirmou, no documento, que a região da Praça da Ucrânia é cercada por vias movimentadas, como a Padre Anchieta, a Capitão Souza Franco e a Padre Agostinho, que sufocariam o ruído do skate na pista. Para evitar problemas com perturbação sonora na madrugada, o documento propõe que sejam estabelecidas regras e horários de uso da pista, e que seja implantado monitoramento.

“E o skate hoje é um está num momento bem diferente do que estava naquela época. Nos anos 1990 ainda tinha muito preconceito, um estigma muito grande. Hoje é um esporte, uma indústria que fatura bilhões de dólares ao redor do mundo, um estilo de vida invejado por muita gente”, diz Senden.

O projeto original da Praça, contendo a pista, foi elaborado pelo renomado arquiteto José Maria Gandolfi, um dos criadores do curso de arquitetura da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Utopia

Os skatistas sabem que têm um desafio pela frente. Estão em contato com vereadores e deputados que dão suporte à causa. O próximo passo é mostrar o que a pista representa e conquistar o apoio da população local.

Senden vê a reativação da pista como uma espécie de utopia: “Acho que é mais sobre reativar o que ela representava. Ela formou muitos atletas, formou muito caráter, muitos seres humanos ali em volta do esporte. Eu acho que não necessariamente se trata de reativar aquela pista, naquele lugar, daquele jeito, mas de certa forma buscar uma resposta para aquilo que aconteceu. Eu queria de certa forma reativar o que ela representa, poder proporcionar para o meu filho um pouco do que eu aprendi ali.” 

Ele conta que a pista da Praça da Ucrânia contribuiu muito para o que é hoje. “Foi na pista da Ucrânia que eu aprendi a me relacionar com pessoas de diversas origens e de caminhos distintos dos meus. E foi ali que eu aprendi sobre dignidade, sobre o ser humano, sobre a amizade verdadeira, sincera. O skate tem um instinto coletivo de amizade muito grande. Forjou o meu caráter”, diz o empresário.