Em redes de pesca, nem sempre chega o que os pescadores esperam. É de se imaginar que com uma vasta biodiversidade marinha, outros animais não saiam ilesos das jogadas de rede no mar. Determinados seres e espécies conseguem aguentar mais tempo presos na malha de fio, mas isso não acontece com alguns animais. É o caso da Toninha (Pontoporia blainvillei). Esse pequeno cetáceo, que agora corre risco de extinção, tem ganhado cada vez mais observadores, os quais unem esforços para manter sua preservação.
O que é a Toninha?
A toninha é a menor espécie de golfinho da costa brasileira. Seu comportamento se difere bastante das outras espécies de golfinhos, já que ela não costuma saltar ou se expor fora da água. Os cetáceos, por uma característica evolutiva, tiveram uma migração das narinas para o alto da cabeça, o que faz com que tenham que subir até a superfície para respirar. A toninha faz isso de forma discreta, dificultando a observação de pesquisadores e curiosos.
Mas não só o comportamento da toninha complica o trabalho dos pesquisadores. Segundo avaliação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), este animal está na lista nacional de espécies ameaçadas, já em status crítico de risco de extinção. O principal motivo da ameaça é a interação do ser humano nas costas brasileiras, que historicamente vem sendo utilizada como espaço de sobrevivência e comércio.
A toninha tem em média entre 1,4 e 1,6 metro. Isso a torna bem menor do que as outras espécies de golfinho, como o Nariz-de-garrafa, que pode atingir mais de 3,5 metros. “Outras características que ajudam a identificar é o rostro (seu ‘bico’) longo e fino, a alimentação e a reprodução”, explica Camila Domit, coordenadora do Laboratório de Ecologia e Conservação (LEC) da UFPR.
Perigos da interação humana
Assim como outros animais (principalmente tartarugas, aves marinhas e golfinhos de outras espécies), a toninha é uma das vítimas da captura acidental pelas redes de pesca. Diferente das tartarugas, que conseguem diminuir seu metabolismo e, portanto, aguentar um tempo maior sem subir à superfície para respirar, a toninha entra mais rápido em situação de estresse, o que acaba a levando a óbito antes de um resgate.
O que faz as toninhas serem capturadas é justamente o espaço em comum de convivência com os pescadores. Os dois buscam o peixe em uma mesma área, o que torna inevitável o encontro dos golfinhos com as redes. No processo de reprodução, estes animais geram apenas um ou dois filhotes a cada ano. Isso impulsiona ainda mais o risco de extinção da espécie e torna essencial as iniciativas de preservação da vida marinha.
A captura acidental ganha esse nome justamente pela não intenção do pescador em ter um animal diferente preso na rede de pesca. Para ele, isso não é vantajoso e acaba até trazendo prejuízo. “Além do não interesse pelo animal, o pescador tem a perda de utensílios e também um problema ético, visto os questionamentos que pode receber da comunidade por ter um golfinho em rede”, conta Domit. Além disso, como o mar é a fonte de renda destes pescadores, muitos deles têm noções de preservação e sustentabilidade do ecossistema do qual tiram o sustento.
Conhecer os responsáveis pela pesca e a comunidade que depende do mar é essencial aos observadores. Para Camila, este contato é o primeiro passo antes de dar início a qualquer projeto na preservação das toninhas. Como pesquisadores da UFPR, eles notaram que existe a necessidade de ser verdadeiro e transparente sobre as próximas ações e interferências no ambiente, já que qualquer proposta vai influenciar diretamente a vida dos pescadores.
“Quando o pescador entende que isso é um problema também para a sociedade e que a pesquisa pode ser uma ferramenta de apoio, as relações se tornam muito positivas”, explica a bióloga da UFPR. Além disso, ela ressalta que o conhecimento do pescador deve ser valorizado e reconhecido durante o processo de pesquisa.
Toninhathon
Entre os dias 1 e 3 de outubro do ano passado, aconteceu o Toninhathon — iniciativa da Associação MarBrasil e o Laboratório de Ecologia e Conservação da UFPR em conjunto com o Instituto Federal do Paraná (IFPR), Agência de Inovação da UFPR, Sebrae e Núcleo de Inovação Tecnológica e Empreendedorismo Sustentável do CPP-Centro de Estudos do Mar (CEM-UFPR). O objetivo era trazer estudantes, pesquisadores, sociedade, pescadores e gestores em uma luta conjunta pela conservação da toninha e outras espécies marinhas.
Foram mais de 350 participantes de diversas universidades e grupos pelo Brasil. A quantidade e diversidade de pessoas cumpriu com a intenção de compartilhar conhecimentos e ideias a fim de achar soluções efetivas. As propostas geradas deveriam seguir os três desafios: redução da captura acidental, desenvolvimento econômico sustentável, comunicação e governança participativa.