sex 19 abr 2024
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Do laboratório para a mesa do consumidor

No Dia Mundial dos Direitos do Consumidor, 15 de março, ocorreu um ato público contra a liberação de duas novas espécies de milho transgênico. Realizado no Passeio Público, o manifesto pretendeu chamar a atenção da presidência nacional. Segundo Seizifredo Paulo Alvez Paz, presidente do Fórum Nacional das Entidades Civis de Defesa ao Consumidor no Paraná e um dos organizadores da manifestação, o Governo Federal aprovou os grãos modificados sem considerar a opinião contrária do Ministério da Saúde e do Ministério do Meio Ambiente.
“A ação do Governo do paí­s foi puramente econômica. Logo no seu primeiro mandato, o presidente Lula aprovou a soja transgênica sem maiores estudos”, declara Alvez Paz. “Os testes para comprovar a segurança desses organismos modificados estão sendo feitos nas próprias pessoas e no ecossistema. Só veremos o resultado daqui a alguns anos”, completa.
O professor do Departamento de Genética da UFPR Juarez Gabardo explica que o novo grão transgênico, o MON 810, possui uma proteí­na que ataca diretamente o estômago das lagartas. Assim, mata a praga e impede que ela prejudique as plantações. “Como o pH (í­ndice de acidez) do estômago dessas lagartas é diferente do humano, não há razão para temer o uso desse milho modificado”, defende.

Melhoramento genético

O melhoramento genético é um processo que pode ocorrer de duas formas. A primeira, praticada há séculos, cruza seres da mesma espécie para obter as qualidades desejadas em um organismo só. “Isso ocorre tanto com grãos como com raças de cachorro”, exemplifica Gabardo. “Mas é um processo demorado e só funciona com indiví­duos da mesma espécie. Não há como cruzar milho com bactérias”.
Quando a engenharia genética começou a ser desenvolvida, esse problema acabou. “A nova variedade não depende de reprodução sexuada. Determinamos a caracterí­stica que cada gene representa e o acrescentamos em outra espécie, controlando resultados. Isso é o transgênico”, esclarece o geneticista.
De acordo com João Carlos Bespalhok Filho, professor do Departamento de Fitotecnia da UFPR e pesquisador na área de transgênicos, o benefí­cio direto da planta modificada é do agricultor. “Graças à resistência desses grãos, o custo de produção diminui consideravelmente. No entanto, nem sempre os agricultores se interessam em abaixar o preço de seu produto, podendo ter um lucro maior. A vantagem não chega ao consumidor”.
A implantação do melhoramento genético contribuiu para a popularização dos alimentos. De acordo com o professor Gabardo, antigamente, poucas pessoas tinham acesso à carne de galinha. Hoje, com os novos métodos de produção, a ave consome menos alimento e chega ao peso ideal para o abate em menos tempo. Como conseqüência, o preço se tornou mais acessí­vel. “Há quem diga que o sabor da galinha é diferente, mais fraco, mas a população mundial cresce constantemente e, sem a transgenia será impossí­vel alimentar a todos”, prevê Gabardo. Alvez Paz, por sua vez, declara que não é a falta de alimento que prejudica a humanidade. “A distribuição desigual é que causa a fome em nosso planeta”, diz.

As implicações polí­ticas
O Governo do Estado, mantendo sua posição de desconfiança em relação aos transgênicos, enviou representantes ao ato público do dia 15. “O governador sabe que nossa economia depende da exportação dos grãos. A soja convencional é vista de forma diferenciada da soja transgênica internacionalmente”, aponta Alvez Paz.
De acordo com Gabardo, o governador Roberto Requião tem uma escolha a fazer. Especifica: “Ou ele expande o território destinado para a agricultura, desmatando e prejudicando o meio-ambiente, ou aceita os transgênicos, que produzem mais no mesmo território”.
O ato público coincidiu com a proibição do plantio de um tipo de milho modificado um dos aprovados recentemente no Brasil na Romênia e com a abolição do plantio de todos os transgênicos na França. Áustria, Reino Unido, Grécia, Hungria, Polônia e Suí­ça também baniram o produto. “O interesse de paí­ses europeus na agricultura é completamente diferente do brasileiro. Lá não há a necessidade de grande produção coisa que os organismos geneticamente modificados possibilitam e que é extremamente importante para um paí­s como o nosso, de agricultura competitiva”, explica Bespalhok Filho.

O consumidor
“Produtos industrializados com concentrações de transgênicos acima de 1% devem ter, em sua embalagem, a logomarca dos produtos geneticamente alterados”, diz Alvez Paz. Ele acredita que a população tem o direito de saber o que está consumindo. “No entanto isso não ocorre na maioria das vezes. Empresas não querem correr o risco de perder o mercado consumidor”.
Bespalhok Filho afirma conhecer apenas uma grande empresa de alimentos que estampa o sí­mbolo dos transgênicos na embalagem. “Hoje em dia, é impossí­vel um óleo de soja no Brasil que não seja feito, pelo menos em parte, com o grão geneticamente modificado. Falta fiscalização do governo para que a norma seja cumprida”, critica.
No que diz respeito à segurança desses produtos para a saúde do consumidor, não há consenso. De acordo com Alvez Paz, os transgênicos não podem ser ministrados à população enquanto não houver provas definitivas de que o consumidor não será afetado. “As razões que levaram a presidência a aprovar as novas espécies de milho são puramente econômicas”, aponta.
Já Juarez Gabardo acha que não há argumentos fortes o suficiente para impedir o consumo de alimentos geneticamente modificados. “Os ativistas apenas conseguem retardar o processo da aprovação dos transgênicos. Eles possuem um discurso muito apaixonado, mas lhes falta embasamento cientí­fico”, critica. “Por trás da questão dos transgênicos há muita politicagem, coisa que não vêm à tona para a população”, pondera Bespalhok Filho. “O certo é que as pesquisas têm que continuar”, opina.
Em um ponto, todavia, todos concordam: os transgênicos precisam ser identificados. Não por uma questão de risco à saúde, mas por respeito ao consumidor que, atualmente, passa sem receber informações sobre o que põe na mesa.

Brasil aprovou o plantio do MON 810, espécie de milho transgênico que é proibida em vários paí­ses europeus
sxc.hu

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