ter 03 dez 2024
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Projeto voluntário ajuda 30 mil alunos a entrarem na universidade

Programa Salvaguarda oferece tutorias, correção de redação e testes vocacionais gratuitamente para estudantes de todo país

Pesquisas mostram que até pouco tempo as universidades do Brasil eram ocupadas majoritariamente por alunos da rede privada. Este ano, pela primeira vez, a Universidade de São Paulo (USP) tem mais da metade dos ingressos provenientes de escolas públicas, atingindo a margem de 51,7% das vagas preenchidas. Segundo a pró-reitoria da Universidade, em 2010 este número chegava a 25,8%. Em 2018, a taxa atingiu a margem de 43%.

O programa de voluntariado Salvaguarda nasceu para tentar solucionar este problema. No primeiro ano do curso de Economia na Universidade de São Paulo (USP), Vinicius de Andrade visitou turmas do ensino médio de escolas públicas da região de São Paulo. Na ocasião, ele percebeu que diversos alunos não tinham esperanças em relação ao vestibular. E pior: eles não tinham informação, já que muitos não sabiam como se inscrever no exame e nem como conseguir uma bolsa de estudo.

A princípio, Vinícius se identificou com os jovens. Ele nasceu em Ribeirão Preto, no interior do estado, e tinha o sonho de ingressar em uma universidade pública, mas não tinha os recursos necessários.

“Moro em um bairro com muitas favelas e, quando cheguei na USP, fiquei muito impressionado com a baixa adesão de alunos de escola pública dentro de uma universidade pública. Costumo dizer que o Salvaguarda nasceu do contraste desses dois mundos”

Vinicius Nascimento, criador do Salvaguarda

No primeiro ano, o projeto funcionava em escala menor, sendo Vinicius a peça que fazia às engrenagens rodarem. Ele mobilizou colegas da USP e, juntos, criaram uma rede para levar informações aos estudantes do ensino médio de Ribeirão Preto. Eram 200 voluntários que aplicavam testes vocacionais, apresentavam e explicavam as profissões, corrigiam redações e davam dicas de estudos para o Enem por meio de visitas às escolas e grupos do WhatsApp.

Em 2020, o projeto se tornou um programa nacional, abrindo portas para participação de alunos e voluntários de todo o Brasil. Este ano foram realizadas 700 inscrições para corretores de redação no Salvaguarda, entre eles universitários e formandos das universidades públicas. Segundo Vinícius, o objetivo do programa é amparar estudantes ao longo do processo de vestibular: “Buscamos auxiliar os alunos de escola pública dentro de três frentes: motivação, conteúdo e informação. Desde a escolha profissional até às informações e conteúdos úteis ao longo do percurso”.

Totalmente gratuito, o projeto conta com um suporte completo para o aluno, que tem acesso a corretor particular de redação, tutor para auxiliar na organização dos estudos; informações sobre as universidades públicas do Brasil; acesso a grupo com monitores e conteúdos de todas as disciplinas; acesso a uma frente de psicologia que organiza encontro semanais de acolhimento e entrevista mensais com profissionais para falarem sobre suas trajetórias.

Os voluntários corretores passaram por uma aula com a professora e youtuber Letícia Góes que, além de dar suporte sobre as competências do Enem, dá dicas sobre como corrigir uma redação. Já os alunos recebem mensalmente temas de redação separados por uma equipe de corretores, que faz a seleção dos assuntos e a produção dos conteúdos.

A professora particular e redatora publicitária Yasmim Nascimento entrou este ano no projeto e atuou como corretora de redação, percebendo uma carência de redação muito grande entre os alunos. “Tinha uma estudante que nunca tinha escrito uma redação na vida. Ela relatou que sua turma era a pior da escola e nenhum professor queria dar aula. Ela tinha muita dificuldade em gramática, ortografia e redação”, conta Yasmin.

Durante os dez meses de acompanhamento por meio de aulas e reuniões no Google Meet, Yasmin sentiu uma grande melhora por parte dos alunos. “Estou orgulhosa de ver que eles conseguiram aprender o que eu estava ensinando. Tive uma aluna que saiu de 400 na redação para 960. Foi um salto muito grande”, relata com felicidade: “Pude perceber que existe essa carência na educação pública em muitos lugares, e os alunos vão com desvantagem para a prova”.

Por outro lado, a estudante de Letras, criadora de conteúdo educacional e voluntária do projeto, Rebeka Tassinari, de 22 anos, notou outra dificuldade no aprendizado. “Conciliar os estudos no projeto com as atividades escolares, com família, trabalho e também enfrentar problemas psicológicos atrelados a esse fatores sem dúvida parecia afetar na preparação para os vestibulares”, relata.

O estresse e a ansiedade são um dos principais sintomas dos adolescentes que estão em ano de vestibular. “O edital do Enem e de outros vestibulares exige uma grande carga de conhecimentos prévio. Então, tornar mais humana possível esta fase é fundamental para uma melhor experiência de ensino e aprendizagem”, complementa a voluntária.

Mariely da Silva, de 19 anos, participou do Salvaguarda em 2020, durante o terceiro ano do ensino médio. A estudante foi a primeira auxiliada de outro estado, abrindo portas para alunos do Brasil inteiro — graças ao projeto, hoje ela faz direito na Universidade Federal do Pampa (Unipampa).

De acordo com a aluna, o programa a orientou em todo o processo de preparação para o vestibular. “O projeto é o suporte que todo estudante da rede pública sonha, eles vibram conosco a cada questão correta e, principalmente, com nossa aprovação”.

Mariely da Silva, de 19 anos, aprovada no curso de direito da Universidade Federal do Pampa (Foto: Arquivo pessoal).

Até o momento, o projeto já auxiliou mais de 30 mil estudantes a conquistarem a tão sonhada vaga na universidade. Em época de aprovação dos vestibulares, o perfil do Instagram do Salvaguarda vira um mural com foto dos alunos aprovados.

Desde 2017, o Salvaguarda auxiliou mais de 30 mil estudantes a ingressarem na universidade pública (Foto: Reprodução).

A expectativa de Vinícius, criador do Salvaguarda, é alcançar cada vez mais estudantes de todo o país. “A curto prazo, vamos desenvolver um aplicativo próprio do programa — quero que sejamos a maior referência nacional de auxílio para alunos de escola públicas. Daqui a cinco anos, imagino o projeto alcançando milhões de estudantes”, revela.

Em 2022, o projeto abrirá vagas para alunos e voluntários interessados em participar. É possível se inscrever e apoiar o projeto no Instagram do Salvaguarda.

Thaysla Neves
Estudante de Jornalismo da UFPR.
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Estudante de Jornalismo da UFPR.
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