Mais underground não poderia ser. Embaixo da travessa Nestor de Castro, dentro da Galeria Júlio Moreira, fica o TUC – Teatro Universitário de Curitiba. Lá, apresenta-se a única peça em inglês do Festival – um monólogo.
Zero – A Postscript to the Anarchist Cookbook lotou o pequeno teatro. O texto de Don Correa não poderia ter sido melhor encenado em outro espaço. O palco fica na mesma altura da primeira fila de cadeiras, o que puxa todo o público para dentro da peça. Apesar do barulho da galeria, a atuação faz com que o espectador sinta-se só. Exclusivo. A combinação do jogo de luzes, entonação das falas e sonoplastia leva o público para um mundo à parte.
Espontaneidade
O cenário é composto por uma cadeira, uma mesa e uma laranja.
O motivo não importa. Se é verdade, não importa. A peça não procura encontrar respostas, mas incitar perguntas. A sociedade morfinizada precisa queimar. É necessário sentir. Agir com espontaneidade. Reagir.
Zero é, em si, uma combustão. Receitas de explosivos e de antídotos para armas de repressão policial são intercaladas com descrições de cenas que mostram o lado apático e deplorável do ser humano. O resultado é uma peça que provoca o tempo inteiro.
The Anarchist Cookbook
Ir a um espetáculo sem saber do que se trata é arriscado. Descobri pouco antes das 19h que a referência era ao livro The Anarchist Cookbook escrito em 1971 por William Powell. Ele ensinava como fabricar explosivos, dispositivos telefônicos caseiros e outros itens.
O livro foi investigado pelo FBI e criticado por anarquistas. Algum tempo depois do lançamento, Powell tentou tirá-lo de circulação, mas não conseguiu por causa dos direitos autorais de quem o publicou. O autor afirmou diversas vezes que a obra foi fruto da raiva adolescente e da possibilidade de ser enviado ao Vietnã para lutar pelos Estados Unidos.
Experiência sensorial
Texto rico, atuação impecável e produção cuidadosa produziram a receita perfeita para uma peça inusitada.
Se você não tem nada pra fazer amanhã às 22h, tem a última chance de experimentar as sensações que Zero incita. Mas se você já tem compromisso… bom, melhor desmarcar e conferir este monólogo. Não tem como se arrepender.