sáb 19 abr 2025
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Criativa e necessária: “Querida Serpente” desconstrói os conflitos de desejo, erotismo e pudor no Festival de Curitiba 

Estreia no Fringe, espetáculo lotou por três dias o teatro Ênio Carvalho

Para quê palco quando se tem uma mesa de centro? E para quê plateia quando se tem convidados para uma refeição? É na quebra da própria estrutura tradicional do teatro que Querida Serpente, novo espetáculo da Alameda Cia. Teatral, absorveu o público com naturalidade para discutir dois dos maiores tabus do cotidiano: desejo e sexualidade.

A peça lotou o teatro Ênio Carvalho de 28 a 30 de março no Fringe, mostra aberta do Festival de Curitiba, sem curadoria obrigatória. Com 280 performances e oficinas, ela funciona como vitrine do teatro brasileiro, dando espaço ao experimentalismo.

Inovadora e prazerosa

 Antes de entrar, o espectador é convidado a um brinde, que desenvolve para uma conversa entre os atores sobre o tema do corpo e seus tabus ao longo da história. Assim, sem nem perceber, já se deu início ao espetáculo, e o público será fundamental para ele.

 Na sala de teatro, outra surpresa: O palco é na verdade uma mesa posta, e os assentos estão todos ao redor dela. 

 Assim, subindo, descendo e caminhando entre as pessoas, os atores frequentemente servem frutas que lembram temas eróticos, intercalando com cenas múltiplas de diálogo, dança, comédia, crítica e tensão. 

No final, rola até um cafezinho, símbolo de intimidade, convite à reflexão sobre nossos espaços mais pessoais, mostrando que há temas ainda mais íntimos que o sexo.

“Parece que eu estou recebendo pessoas na minha casa. Para mim é um lugar comum e gostoso”, conta Beatriz Baltazar, uma das atrizes.

“Eu só começo a ficar nervosa quando é para eu entrar em cena nua. Para mim é o momento mais desafiador, quando estou só com o corpo e vejo as pessoas, as caras, os olhares e os incômodos delas. Me dá um nervosinho, principalmente quando são pessoas conhecidas”.

 O diretor, Cristovão de Oliveira, comenta: “Não tinha como falar desse tema sem ter a nudez presente. Ela ainda é um tabu para nós, então tentamos colocá-la neste outro lugar, de naturalidade”.

Entrevista com Cristovão de Oliveira

 Com facilidade, o espetáculo chocaria qualquer mente mais conservadora. Faz sentido, já que para o diretor a nudez é totalmente política.

 “Também têm as críticas ao corpo da mulher e seu lugar subjugado, então procuramos inverter alguns padrões para discutir isso. Tudo é político pois é pessoal”, finaliza Cristovão.

 Beatriz complementa: “Viemos falar que o corpo é um corpo, e a intimidade está muito além dele”.

 Entrevista com Beatriz Baltazar
Além do erotismo, Querida Serpente explora as várias formas de intimidade, tanto através de discursos diretos como de representações abstratas. (Foto: Lorenzzo H. de Paula Gusso)

Processo Colaborativo

Uma curiosidade que surpreende: a peça não tinha texto nem estrutura prévia. Tudo nasceu de improvisos nos ensaios, fruto de uma oficina da Alameda Cia. de Teatro, onde alguns participantes decidiram criar algo prático.

O espetáculo tomou forma ao longo de vários encontros, guiado pela leitura de Histórias Íntimas: Sexualidade e erotismo na história do Brasil, de Mary del Priore, e por dinâmicas que testavam o que funcionava em cena.

Agora, com o sucesso da peça, Beatriz comemora: além de cobrir o aluguel do teatro, talvez dê até para bancar a montanha de frutas e café usados ao longo das sessões.

Ficha Técnica:

Companhia: Alameda CIA Teatral 

Elenco: Aline Navarro, André Luis Cassio, Beatriz Baltazar, Leda Jankoski, Mateus Armando 

Direção: Cristovão de Oliveira

Assistência de Direção: Galvani Jr. Preparação Corporal: Dani Durães  Realização: Alameda Teatral.

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