ter 19 mar 2024
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Estudantes reclamam de falta de auxílio pedagógico e social durante pandemia

Gabriela Reyes, chefe da Unidade de Atendimento Psicossocial da UFPR, reconhece dificuldades e alega que problema decorre da sobrecarga de trabalho ocasionada pelo trabalho remoto

A Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis da Universidade Federal do Paraná (PRAE) oferece apoio para o corpo estudantil da instituição, responsabilizando-se pelos atendimentos psicológicos, acolhimento social e administração de auxílios. São contemplados mais de 4 mil estudantes pelo programa de bolsas da UFPR, além dos serviços prestados para toda a comunidade estudantil. Nesse contexto, Gabriela Reyes, chefe da Unidade de Atendimento Psicossocial (UAPS) da PRAE, relata uma demanda enorme que nem sempre pode ser cumprida.

Gabriela tornou-se chefe da UAPS há cinco meses, quando as atividades presenciais da Universidade já estavam suspensas há mais de um ano, devido à pandemia da Covid-19. Dentro da PRAE, a  unidade de atendimento garante a coesão entre os aspectos psicossociais e econômicos de alunos em vulnerabilidade social. “Temos três carros chefes: atendimento para problemas relacionados a se manter na universidade, como a ansiedade; a pedagogia relaciona-se à questão da organização e cria cronogramas para integrar o estudante”, conta Gabriela. “Os assistentes sociais analisam a situação do estudante para verificar se devem receber auxílios”.

São diferentes setores — pedagógico, socioeconômico e psicológico — que trabalham em conjunto para garantir a permanência do estudante na universidade. Segundo Gabriela, essa é a essência da PRAE. Mesmo assim, não significa que seja um trabalho sem defeitos. 

A estudante de Agronomia  Alessandra Maria Reis, 24 anos, aponta problemas com a comunicação da PRAE e relata dificuldades no período de renovação dos benefícios: “A comunicação na hora do edital é péssima. Eles são meio frios, não são pessoas que escutam e entendem. Inclusive, eu tenho uma amiga que só foram escutar o caso dela quando ela chegou chorando lá desesperada. Essa etapa de acolhimento deles, pré e durante o edital é péssima, as pessoas têm ataque de pânico com essas coisas.”  

Alessandra é estudante do curso de Agronomia e recebe os auxílios moradia, permanência e refeição (Fonte: Arquivo pessoal)

Durante o trabalho remoto, os e-mails referentes a cada setor são a única forma de comunicação disponível para os estudantes. O fluxo de e-mails é tamanho que Gabriela tem que responder as mensagens devido ao número reduzido de funcionários: “Nós temos sete psicólogos em Curitiba, responsáveis por um corpo estudantil de quase 30 mil alunos”. Mesmo assim, ela garante que os e-mails são respondidos na medida do possível e que os profissionais de outros campi são chamados para ajudar, já que o serviço acontece remotamente. 

O setor pedagógico também apresenta desfalques na equipe. No total, a PRAE tem seis pedagogos, distribuídos em todos os campi. O setor pedagógico faz a gestão dos projetos de inclusão digital — empréstimos de notebook e envio de pen drives com rede de internet móvel —, elabora os editais e seleciona os alunos aptos a esses programas. Além disso, realiza acompanhamento pedagógico dos estudantes. O  pedagogo do campus de Jandaia do Sul e doutorando em Educação, Sidney Lopes Sanches Junior, reconhece a competência de sua equipe, mas ressalta que é pequena. Ele também reconhece as dificuldades da pandemia.

Pedagogo no campus de Jandaia do Sul, Sidney Lopes Sanches Junior admite dificuldades para o acompanhamento durante o trabalho remoto.

Por isso, o acompanhamento pedagógico desses estudantes é a prioridade. O programa Tutoria em Pares busca auxiliar quem necessita de ajuda acadêmica uma vez que a reprovação pode significar perda dos auxílios. Para Sidney, a comunidade estudantil deve entender realmente as funções da PRAE e entender que a instituição está ciente de suas limitações.

Para o pedagogo, comunidade acadêmica precisa entender o papel e as limitações da PRAE

Gabriela Reyes, também doutora em Psicologia, concorda e afirma que o acolhimento psicológico costuma ser compreendido erroneamente. Mariana Souza, beneficiária do Programa de Benefícios Econômicos para Manutenção aos Estudantes de Graduação e Ensino Profissionalizante da UFPR (PROBEM), procurou atendimento psicológico em 2019. Ela esperava uma consulta aberta a seus problemas familiares, mas o atendimento relaciona-se apenas a questões que afetam o âmbito acadêmico dos alunos. 

Mariana Souza é estudante de Jornalismo. Desde que ingressou, em 2019, recebe os auxílios moradia, refeição e permanência (Fonte: Arquivo pessoal)

A decepção de Mariana está relacionada à falta de alternativas para isso. Porém, para Gabriela é humanamente impossível realizar terapia dentro de uma universidade federal: “Que universidade faz isso? Nenhuma”, reclama. Além disso, a preocupação da chefe da UAPS está na qualidade do atendimento:

“Para realizar psicoterapia com todos que buscam, teríamos que ter uma equipe muito maior. Qual o apoio que um acolhimento, uma consulta de 15 minutos, ofereceria?”

A prioridade da PRAE é sempre estudantes em vulnerabilidade social. O coordenador de assuntos estudantis, Fernando Sureck Leal, explica o processo: “Não é só a renda, o ensino, a saúde, a violência e o preconceito também colocam os alunos numa lista de prioridades.” O questionário, que inclui um testemunho dos alunos, busca ponderar tudo isso: “O relato é importante para que possamos fazer um acompanhamento mais próximo.” Ele exemplifica: “É diferente um aluno que tenha R$ 1,2 mil  de renda mensal, mas não tem nenhum agravante e um aluno que tenha uma renda maior que 3 salários mínimos e tenha alguma doença terminal, por exemplo”.

A administração da PRAE tem autoridade quanto ao número de bolsas oferecidas. O fundo governamental Pnaes custeia o orçamento que operacionaliza o PROBEM. Segundo Fernando, nos últimos dois anos esse orçamento vem diminuindo, de R$ 22 milhões para R$ 14 milhões. De acordo com o portal de transparência da PROCLA/UFPR, o orçamento de 2021 é estimado em R$ 1.678.475.431,00. Fernando estima que desse valor, R$ 14 milhões são destinados aos auxílios. 

Linha do Tempo Orçamentária

Desde 2017, os números orçamentários da UFPR oscilam. Por causa disso e do valor fixo das bolsas, o número quantitativo das bolsas varia. Fernando afirma: “Hoje, atendemos aproximadamente 4 mil estudantes, mas já chegamos a atender 5 mil”.

O pagamento das bolsas foi mantido durante a suspensão das aulas. Nesse contexto, foram criadas medidas para garantir o redirecionamento do orçamento. O fechamento do Restaurante Universitário impactou os alunos. Segundo Mariana: “O que nós mais sentimos no começo foi falta do RU.” Para compensar isso, a PRAE utilizou o valor direcionado ao Restaurante Universitário para custear um auxílio refeição emergencial no valor de 250 reais.  Mas Fernando ressalta: “Esse ano foi diferente e quando o RU voltar isso não vai permanecer igual.”

Contudo, Mariana relata: “O auxílio refeição emergencial demorou para sair. Foi tudo meio bagunçado, eu senti que eles não sabiam muito bem o que fazer e aí meteram os pés pelas mãos.” De acordo com ela, as orientações não foram claras: “Eles pagaram o auxílio daí a gente não sabia se tinha que prestar contas, como funcionava. Essa foi a parte que sentimos mais falta, o resto eles continuaram pagando normal. O que mudou foi a data dos editais, daí ficamos em dúvida se eles continuariam com os pagamentos ou suspenderiam. Mas eles prolongaram as últimas parcelas do edital anterior”

As maiores limitações da PRAE estão relacionadas aos cortes de orçamento e redução de funcionários. Acima de tudo, a chefia assegura que a prioridade é a permanência do aluno: “Nós existimos por vocês, para garantir o seu sucesso.” Gabriela reforça. “Eu sei que está difícil para todo mundo. Como adultos da relação, precisamos garantir a segurança de vocês. Só pedimos um pouco de empatia; tudo que for possível fazer para ajudar nós faremos.”

Vídeo da Gabriela falando sobre as limitações dos psicólogos da PRAE

Reportagem de Isadhora Santa Clara e edição de Bruna Eduarda Rudnick

Isadhora Santa Clara
Estudante de Jornalismo da UFPR.
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