ter 11 nov 2025
HomeCulturaNo Paraná, plataformas de leitura escolares não são sinônimo de formação de...

No Paraná, plataformas de leitura escolares não são sinônimo de formação de leitores críticos do mundo

Implementado em 2022, o Leia Paraná divide opiniões entre professores e alunos, revelando uma sutil privatização da educação pública paranaense

Por Emanuelle Viana, Giovana Gama e Juliana Levandovski

A presença de crianças e adolescentes em ambientes digitais tem se tornado cada vez mais comum. Segundo a pesquisa TIC Kids Online Brasil 2024, realizada pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), 93% do público da faixa etária de nove a 17 anos é usuário de internet no país, sendo que, desse número, ao menos 81% dispõem de celular próprio.

É nesse cenário de imersão tecnológica que alguns hábitos do cotidiano se reinventam e ganham novos formatos – e as mudanças já se expandem também aos espaços de educação pública do Brasil. Se antes era comum encontrar crianças e adolescentes lendo histórias em quadrinhos e obras de literatura físicas pelas escolas, agora o ato de ler é associado à utilização de plataformas digitais.

No Paraná, na Rede Pública Estadual de Ensino, o programa de leitura digital usado em sala de aula é o “Leia Paraná”. Implementado pela Secretaria da Educação (SEED/PR) em 2022, o objetivo da ferramenta é “fomentar o gosto pela leitura, desenvolver competências leitoras, fortalecer o hábito de ler nas diferentes áreas do conhecimento e contribuir para o desenvolvimento da cultura digital”, conforme descrito no site Plataformas Educacionais – Leia Paraná | Escola Digital – Professor.

Mas, apesar da proposta que parece demonstrar preocupação com o futuro dos leitores paranaenses, a professora e membra do Departamento de Planejamento e Educação Escolar (DEPLAE), do Setor de Educação da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Daniela de Oliveira Pires, explica que a plataformização dos processos educacionais é caracterizada como uma forma de privatização, em que instituições privadas fazem a gestão da escola pública e, no caso da leitura, inserem na educação uma lógica de engrenagens de fábrica, em que o estudante cumpre metas e precisa gerar resultados.

“Hoje, no Paraná, a chamada é online, o controle do livro é online e as notas
são publicadas online. Essa distância da relação entre professor e aluno se
aprofunda e a literatura deixa de ser algo prazeroso para ser uma obrigação. O
aluno se transforma em uma métrica e o saber literário é confundido dentro dessa
lógica de produtividade”, explica Pires.

Nesse sentido, a pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, divulgada pelo Instituto Pró-Livro em novembro do ano passado, revelou que o número de leitores que enxergam a escola como um ambiente propício para a leitura reduziu de 23% para 19% nos últimos quatro anos. Os dados mostram que, ainda que familiarizados ao mundo digital, quando o assunto é a leitura, não significa que “modernizar” seja a alternativa mais adequada para incentivar o hábito entre as crianças e adolescentes.

Para entender a perspectiva pedagógica, o Jornal Comunicação conversou com uma professora da rede pública de ensino de uma escola localizada na Região Metropolitana de Curitiba (RMC). Por questões de segurança, o jornal mantém a identidade da profissional em anonimato e adota o nome fictício de Fernanda. Quando questionada sobre os malefícios da utilização da plataforma em sala de aula, Fernanda explica que a falta de variedade de conteúdo e, principalmente, a maneira como a leitura é feita, com os estudantes agrupados em uma sala de informática, acarreta a falta de concentração.

A professora acrescenta que incentivar uma cultura do livro é urgente. “Você dá um texto de mais de uma página e eles [estudantes] acham que é muito longo, não têm paciência de ler e isso interfere em todas as outras áreas: em Língua Portuguesa, em História, Geografia, Matemática. Eles não conseguem entender uma notícia, ler a realidade ao redor deles e isso gera outros problemas”, diz.

A discussão completa do assunto você encontra na reportagem especial “Plataformização da leitura em escolas: a (nada) sutil privatização da educação pública paranaense”, que problematiza a padronização e inserção de plataformas nos processos educativos de leitura do Paraná. Ao conversar com uma especialista e com quem lida com essas medidas no dia a dia, a reportagem questiona o futuro de uma sociedade em que o ato de ler é atrelado à lógica de produção e apresenta os desdobramentos de duas pesquisas realizadas pela equipe do Jornal Comunicação.

NOTÍCIAS RELACIONADAS
Acessar o conteúdo