sex 19 abr 2024
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Resolvendo a consequência de um problema maior

Nós já sabemos a história. É impossível julgar como culpados apenas os menores infratores, como indivíduos isolados que nasceram para a vida criminosa. A culpa é nossa também. É a defesa mais brilhante dos que são contra a redução da maioridade penal, justo porque é uma defesa válida. Só que a questão é muito mais abrangente, mais delicada, para ser resumida em um fato tão pequeno. É sim a nossa culpa, como sociedade, que o crime seja algo não apenas acessível, mas recorrente para os adolescentes. O que precisa ser entendido é que a redução da maioridade penal não é uma forma de proteger a sociedade ainda intacta dos perigos do monstro que ela própria criou. Reduzir a maioridade penal é o primeiro passo para resolver o problema.

Para entender isso, precisamos analisar bem tudo o que está sendo feito, proposto e dito. Começando com o que nós temos hoje, como são tratados os casos de menores infratores. Quando um menor comete um crime, ele é mandado para a Fundação Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente (CASA), antiga Fundação Estadual para o bem Estar do Menor (Febem), onde pode ficar até um prazo máximo de três anos. Uma vez dentro, não há separação entre os menores por tipo de crime cometido. Isso quer dizer que quem roubou comida vai conviver diariamente com aqueles que foram pegos por assassinato e/ou estupro.

O projeto de redução da maioridade penal visa alterar isso de modo a aumentar o tempo de internação para até 8 anos em casos de crime hediondo, e crime hediondo apenas. A partir dos 18 anos, os internados seriam movidos para uma ala separada dos infratores mais novos. Essa mudança não afeta em nada as crianças que são pegas roubando, por exemplo. A nova lei servirá apenas para a faixa etária de 12 a 18 anos. O que o Estado entende por esse projeto é que o adolescente capaz de cometer um crime hediondo precisa de um tratamento diferenciado do adolescente que comete um crime comum. Por mais que se debata até onde vai a capacidade de um adolescente de discernir o certo do errado, há de se concordar que mesmo o adolescente mais novo sabe o que significa homicídio. E se está aumentando cada vez mais os casos de adolescentes que entram no mundo do crime, ou é por consciência da impunidade, ou são levados por um ambiente hostil de criminalidade. São ambas situações causadas por um mau funcionamento da estrutura socioeconômica do país, que inevitavelmente gera ambientes de violência contínua, na maioria das vezes em lugares onde a pobreza é mais acentuada. É um problema de todos, mas a recusa em aceitar essa mudança não é uma aceitação de culpa. É fechar os olhos para a realidade que se esconde por trás dessa polêmica.

Nós precisamos sim melhorar a educação, diminuir a desigualdade social e cumprir com tantas outras reivindicações que irão ajudar a diminuir a taxa de violência, principalmente em caso de menores. Mas essas metas e o projeto de redução de maioridade penal não são excludentes. Nós temos o histórico de uma sociedade que começou muito exigente e dura para com seus cidadãos, e foi abrandando com o tempo. Somos agora a geração que acredita em melhoras sem punição. Isso por um lado é um avanço, mas por outro está nos afastando da realidade. Realmente não basta apenas diminuir a maioridade penal para diminuir a violência, é preciso mudar as raízes do pensamento de cada cidadão. E a nova lei é a primeira etapa para conseguir isso. Punir crimes hediondos, independente da idade de quem os cometeu, foi a mudança mais urgente. Não deve ser encarada como um retrocesso, ou uma afronta aos direitos da criança e dos adolescentes. É uma medida válida para atender a necessidade de se corrigir uma falha do nosso sistema.

A partir dessa mudança, a sociedade estará se preparando para encarar seus problemas sem se deixar levar pelo lado emotivo. Basta sempre estudar causas e consequências, e então elaborar uma solução. É uma pena, sim, que os nossos erros geraram ambientes capazes de corromper a mente dos mais jovens, mas deixar de punir seus crimes não fará com que se tornem pessoas melhores. O que nós precisamos fazer agora é encarar as consequências, controlá-las e então impedir que a situação se repita. Apenas admitir o erro não vai nos levar a lugar algum.

Confira também o  nosso artigo contra a redução: https://jornalcomunicacao.ufpr.br/materia-15048.html

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