Segundo estimativas da Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 5% da população mundial apresenta características de altas habilidades, também conhecida como superdotação no Brasil. Contudo, esta estimativa é centrada somente na mensuração do quociente intelectual como parâmetro, sendo que, quando se consideram outros elementos do desenvolvimento humano, o número de pessoas superdotadas pode ser bem maior. Muitas vezes, a condição não é identificada da forma adequada, em que muitos indivíduos a tenham, mas nunca saibam disso, ao longo da vida. Além disso, quando identificada, seu nome pode trazer a ideia de um “superpoder”, invisibilizando a realidade enfrentada por membros desse grupo.
Identificação
Alguns indicativos dessa neurodiversidade são uma grande intensidade emocional, queixas sensoriais (como de barulhos e cheiros), inquietação e hiperfoco. Esses fatores também podem caracterizar outras condições psicológicas, podendo induzir superdotados não identificados a acreditarem que apresentam outra diversidade cerebral diferente da que realmente fazem parte. Além disso, um desenvolvimento moral de justiça desde cedo e um raciocínio lógico complexo são outros indicadores de altas habilidades/superdotação.
Daphne Queiroz (34) é psicóloga e especializada no atendimento de adultos com essa condição. Ela afirma que muitos de seus pacientes a procuram num primeiro momento por acharem que apresentam algum transtorno psicológico ou por descobrirem a condição de altas habilidades em seus filhos, já que essa identificação ainda não é muito conhecida. “As pessoas chegam muitas vezes para mim achando que não têm isso [altas habilidades/superdotação], porque elas acham uma arrogância, uma petulância acharem que elas têm uma alta habilidade em algo”, afirma a psicóloga. “Esse termo é um pouco ruim, o ‘superdotado’ também. Eles odeiam”, complementa.
A descoberta precoce dessa neurodiversidade, de acordo com Daphne, pode contribuir com um melhor autoconhecimento, um crescimento mais saudável e prazeroso para o indivíduo, além de validar os sentimentos diferentes que os acompanham desde cedo.
Uma das pessoas que acabou identificando a condição após a vida adulta foi Renata. Atualmente com 40 anos, a pesquisadora descobriu ser superdotada com 39, após seu filho José, com 4 anos na época, receber o laudo de altas habilidades. José havia recebido um diagnóstico errôneo de autismo, mas após uma consulta com uma neuropediatra começou-se uma investigação até a identificação da neurodivergência correta. “Na consulta ela disse que José não tinha autismo, mas sim altas habilidades. E que eu também tinha. Por isso fizemos a avaliação e descobrimos.”, afirma.
Depois de receber a identificação, Renata conta que começou a compreender melhor a si mesma, mas que o que mais fez diferença foi descobrir o que seu filho tem de verdade fez com que ela soubesse, a partir de então, como lidar com ele da melhor forma possível.
“Hoje eu consigo entender muito melhor o meu filho do que eu me entendia e do que meus pais me entendiam quando eu era criança.”
Renata Tedeschi (40) sobre a descoberta precoce de altas habilidades em seu filho José e como isso difere da descoberta tardia da mesma condição em si mesma.
E a romantização?
Por conta de seu nome sugerir que quem tiver altas habilidades/superdotação terá vantagens contra os “comuns”, surge então uma romantização sobre essa neurodivergência. Isso pode acarretar em uma maior dificuldade de identificação dessa condição nos indivíduos, além de diminuir as dificuldades de quem a tem, como conta Queiroz.
Assim como Daphne, Patrícia Neumann também concorda que existe uma idealização acerca do nome “altas habilidades”. A psicóloga, pesquisadora, professora e avaliadora desta condição descobriu com 29 anos a superdotação e, desde então, se dedica a estudar e trabalhar com essa condição neurodivergente. Para ela, existem dois fatores que contribuem para essa ideia não condizente com a verdade. “A falta de conhecimento e esse ideal, essa fantasia de que é possível ter uma vida humana sem dificuldades, sem um mal-estar, sem alguma coisa que gere um desconforto. (…) De alguma forma isso se conecta e é projetado na pessoa superdotada”, afirma.
“As pessoas em geral não estão querendo conhecer a pessoa superdotada. (…) Elas já têm uma concepção pronta, que é uma fantasia.”
Patrícia Neumann (40), psicóloga e professora que descobriu a superdotação com 29 anos.
Carla Cunha é advogada e também faz parte do grupo de pessoas identificadas com essa neurodiversidade, após um acompanhamento psicológico de 12 anos e investigações que chegaram a conclusões erradas, até que depois de uma mudança quase contínua de psicólogos e de tratamentos que ocorreu a identificação correta. Para ela, há um estereótipo muito distorcido que a sociedade em geral acredita: o ponto de que só existe o lado bom de ter superdotação, como uma vantagem universal comparada ao resto. “A romantização das altas habilidades é um grande desserviço, porque dificulta muito. Dificulta o tratamento, dificulta o respeito”, relata.
Serviço
Caso você tenha se identificado com algum dos indicativos ou queira saber mais sobre as altas habilidades, seguem sugestões de institutos e centros de neuropsicologia para pesquisa e contato.
Instituto Mentorial
R. São Francisco, 232 – Centro, Curitiba
Contato: (41) 989045769
Cognos Centro de Neuropsicologia
R. Dr. Zamenhof, 360 – Alto da Glória, Curitiba
Contato: (41) 99725-9802