qua 30 abr 2025
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Olhar de Cinema exibe “A Gente”

Após ganhar projeção internacional com os curtas A Fábrica (pré-indicado ao Oscar de 2013) e Pátio (participante do Festival de Cannes de 2013), Aly Muritiba fechou a Trilogia do Cárcere com A Gente. Seu primeiro longa solo integrou a programação da terceira edição do Olhar de Cinema, festival do qual é organizador, e praticamente lotou a sala 2 do Espaço Itaú, em plena noite de quarta-feira. 04 de junho.

Jefferson Walkiu, inspetor de presídio e protagonista do longa-metragem A Gente
(Foto: Reprodução RPC)

A trilogia aborda o tema da realidade carcerária sobre três pontos de vista distintos: o da família dos presos, o dos próprios presos e, agora, o dos agentes penitenciários. “A ideia que se faz do agente penitenciário é a de um sujeito violento, de nível educacional muito baixo, e que efetivamente tortura por prazer. Na verdade essa é uma visão distorcida e anacrônica”, afirma Aly Muritiba, ex-agente penitenciário, que buscou em seu filme exatamente humanizar o agente – daí o trocadilho do título, além de apresentar um panorama dos meandros da burocracia carcerária.

Deu certo. Os estereótipos acerca do agente já começam a ser desconstruídos com a escolha do personagem condutor, Jefferson Walkiu, inspetor da Equipe Alfa do presídio, mas também um pastor evangélico e pai de dois meninos. Apesar de serem poucas as cenas em que o cotidiano do inspetor fora do ambiente carcerário é abordado, são cenas essenciais para evidenciar o que é apenas pressuposto: o agente também é gente. Quanto à burocracia carcerária, ela é apresentada como o fator que emperra o sistema no país. Uma vez que o esforço de Walkiu em tentar organizar o ambiente em que trabalha não é suficiente, porque a instituição se impõe sobre o indivíduo.

Para poder gravar o filme, Aly Muritiba, que trabalhou durante sete anos como agente penitenciário, pediu reintegração ao Centro de Detenção de São José dos Pinhais. Foram oito meses nos quais, além de exercer sua função de agente, ele incorporou a câmera na rotina da prisão. “Quando eu não ia com a câmera, os presos me perguntavam: ô, seu Muritiba, cadê a câmera?”. Muritiba, diretor e roteirista, precisou aprender a lidar com o aparelho, posto que foi necessário dispensar a equipe de filmagem de dentro da prisão, tanto por questões de segurança, “como eles eram alienígenas naquele meio, era sempre necessário que alguém cuidasse da segurança deles”, quanto pelo desconcerto que a presença da equipe provocava nos presos, os quais faziam gracejos em frente às câmeras. Quando Aly assumiu as filmagens de dentro da prisão, conseguiu integrar e naturalizar a câmera ao ambiente.

Documentário ou ficção?

Quem procurou A Gente na programação do Olhar de Cinema percebeu que o filme estava enquadrado no gênero documentário, contudo, havia cenas tão bem construídas que o público ficou com a dúvida: há, afinal, encenação? “Tem. Eu não vou dizer em quais cenas, mas tem!”, admitiu abertamente no espaço para debate que foi aberto após a sessão.

A Gente, afirma o cineasta, na verdade é um híbrido – é um filme de observação, não um documentário em si. O diretor expôs que, apesar de não ter tido um roteiro, seu filme apresenta uma dramaturgia clássica: há a apresentação do personagem, o chamado para aventura, um momento de crise, clímax, resolução, além de toda uma construção em cima do verdadeiro Walkiu, que representa o herói que fracassa. Mas, ainda assim, as situações apresentadas no filme ou são genuínas ou são representações feitas com o olhar de quem conhece muito bem a realidade carcerária – logo, mantém-se a aura de documentário que domina o filme.

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