sex 19 abr 2024
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Os demônios da homossexualidade

Jovem chama a psicóloga Marisa Lobo para curar sua heterossexualidade, ironizando a opinião dela sobre a “cura” de homossexuais. Foto: Lucas Panek

Entrou em discussão na Comissão dos Direitos Humanos e Minorias (CDHM) da Câmara dos Deputados, há mais de um mês, a proposta que revoga dois artigos da resolução do Conselho Federal de Psicologia. Um impede os profissionais de tratarem dos homossexuais como doentes e o outro reforça que os psicólogos não devem se portar de forma preconceituosa em relação aos gays. Junto, o presidente da comissão, Marco Feliciano (PSC-SP), colocou em votação o projeto que penaliza a discriminação contra heterossexuais. Evidencia-se, nesse sentido, uma inversão dos valores defendidos até a entrada desta gestão, que atendia aos interesses das minorias.

O projeto, aprovado depois de cinco tentativas, é conhecido por “cura gay”, uma vez que busca permitir que a psicologia trate dos homossexuais como doentes mentais, assim como alguns pastores evangélicos mais exaltados fazem, só que estes os curam retirando os demônios – exemplo disso é a pregação de um pastor curitibano, num dos seus cultos na Universal do Reino de Deus da Av. Sete de Setembro, “Gostaria de pedir votos para os deputados da Igreja, pois eles lutarão para tirar os demônios dos homossexuais desse país. Olharão por nós na Câmara”. Como a equipe é formada, majoritariamente, por membros da bancada evangélica da Câmara, a aprovação do texto era tida como certa por muitos.

Entretanto, o primeiro problema aparece já na escolha do Deputado Pastor Marco Feliciano como presidente da comissão, uma vez que ele responde a um processo no Supremo Tribunal Federal que o acusa de homofobia. E como transcreve o site da Câmara dos Deputados ( http://www2.camara.leg.br/atividade-legislativa/comissoes/comissoes-permanentes/cdhm/conheca-a-comissao/oquee.html ) , “Suas atribuições (da comissão) constitucionais e regimentais são receber, avaliar e investigar denúncias de violações de direitos humanos […] cuidar dos assuntos referentes às minorias étnicas e sociais […] e contribuir para a afirmação dos direitos humanos.”

Portanto, a comissão deveria, constitucionalmente, investigar Marco Feliciano. Propor a criminalização do preconceito e homofobia. E incentivar, também, o respeito às diferenças, assim como promover ações com fins educativos que transmitam os valores culturais influentes na sexualidade dos brasileiros.

A psicologia defende que a homossexualidade não é doença, distúrbio ou perversão, e que no meio social existe um problema com relação às práticas sexuais que divergem das estabelecidas, sócio-culturalmente. Dessa forma, em resolução do CFP Nº 001/99:

Art. 2° – Os psicólogos deverão contribuir, com seu conhecimento, para uma reflexão sobre o preconceito e o desaparecimento de discriminações e estigmatizações contra aqueles que apresentam comportamentos ou práticas homoeróticas.

Art. 3° – os psicólogos não exercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos ou práticas homoeróticas, nem adotarão ação coercitiva tendente a orientar homossexuais para tratamentos não solicitados.

Tais artigos seguem os passos da Organização Mundial da Saúde (OMS) que, em 1990, excluiu a tipificação de patologia à homossexualidade. O que não retira a possibilidade do psicólogo em trabalhar com as dores provenientes da orientação sexual. Como é a luta da psicóloga Marisa Lobo, ativista em favor do projeto, que só não entendeu que para este fim o regulamento não precisava ser aprovado. Um caso famoso de punição do CFP é o da psicóloga carioca, Rozângela Alvez Justino, que tentava transformar em heterossexuais todos os indivíduos que se relacionavam com o mesmo sexo e frequentavam seu escritório.

Cabe explicar aqui como funciona o processo da “cura” pelos evangélicos – não que todos considerem os homossexuais como doentes, mas é uma doutrina da religião, que não é proibida por lei. Em entrevista à revista Expressão, Célio Soares, de Fortaleza, conta como foi transformado de travesti para um homem de Deus, milagrosamente. “Antes de ser transformado por Jesus, era um escravo do Satanás.”, relata a revista ao comparar a opção de vida de Célio como incumbência de um demônio. O “curado” conta que apenas subiu no altar depois da chamada do espírito, acreditou, e saiu de lá como outra pessoa. Ele disse que antes era portador do vírus do HIV, e que ao deixar a sede da Assembléia de Deus, naquele dia, fez exame e deu negativo. Esse, e vários outros relatos podem ser lidos aqui (http://adbrasil.ning.com/profile/CelioSoares).

Entretanto, nem todos os tratamentos são tão simples. Um jovem do Pará, que preferiu não se identificar, relatou a sua experiência traumática com a cura evangélica: “Meus pais são evangélicos, e são contra a minha escolha. Obrigaram-me a participar do tratamento. Era uma lavagem cerebral sexual”. O adolescente conta que depois do incidente, nunca mais conseguiu se relacionar com ninguém, “o pastor disse que é melhor um assexuado do que uma bicha”. Esses casos, sim, deveriam ser tratados pela psicologia.

Essa sentença é equivalente ao do Deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), suplente da CDHM que causou polêmica em 2010 pelas declarações homofóbicas. Nelas, ele defendia a violência contra crianças que possuem tendências homossexuais: ” O filho começa a ficar assim meio gayzinho, leva um coro, ele muda o comportamento dele”.

Ao que parece, o Brasil regride na questão dos Direitos Humanos. Com esse retardamento, caso a proposta seja aprovada, pode iniciar-se o processo de criminalização do homossexual. Primeiro, o que era tido como homossexualidade, volta a ser homossexualismo, daí só falta adicionar pena de morte, como acontece na Somália.

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