Curitiba é a atual vencedora da categoria “Capitais” do prêmio Cidades Excelentes. Além disso, acumula reconhecimentos de gestão urbana, planejamento etc. Isso a torna um modelo não só entre as grandes cidades nacionais mas também mundo afora.
A capital paranaense é conhecida pelo seu hábito de descartar o lixo de forma correta, como forma de zelar pelo espaço público. A região central e bairros próximos contam com diversas lixeiras para que o cidadão faça sua parte e garanta uma rua mais limpa.
A cidade possui projetos de coleta seletiva que abrangem 100% dos bairros curitibanos. No entanto, as divisas entre a capital e as cidades de sua região metropolitana criam zonas cinzentas, sem clareza se o local pertence à Curitiba ou a sua cidade vizinha.
Para entender a rotina de coleta seletiva, encaminhamos um pedido ao Departamento de Limpeza Pública solicitando o mapa da coleta de recicláveis na cidade. Em resposta, recebemos um PDF ilegível.
Entramos em contato com a gerência de limpeza da Secretaria do Meio Ambiente para questionar como seria feita a leitura do mapa nas condições fornecidas, mas não obtivemos resposta.
A aparente transparência da coleta de lixo em regiões distantes do centro e dos bairros mais ricos faz com que os resíduos se acumulem em locais inapropriados. Nossa equipe de reportagem conversou com João Pedro Cordeiro, que reside na divisa entre Curitiba e Araucária.
João Pedro relatou algumas situações de coletas de lixo durante períodos de sua vida. Segundo ele, entre 2019 e 2021, residiu na Cidade Industrial de Curitiba (CIC) e no bairro Água Verde.
O morador diz que, comparando os dois bairros que morou, via grandes diferenças na regularidade de coleta seletiva. No CIC, acontecia três vezes na semana a retirada de lixo comum e apenas uma vez a de recicláveis. Já no Água verde, o serviço era disponibilizado cinco dias para o primeiro e três para o segundo.
Atualmente, João Pedro reside na fronteira entre Curitiba e Araucária, em uma região que não é abraçada por nenhuma das cidades, e dá o seu relato:
“No início de 2022 [quando me mudei para a fronteira], estranhei muitas coisas quanto a configuração da localidade. No contrato de locação da casa, era descrito: Rua Nestor Pereira Habkost. Como eu dependia de transporte público ou carros de aplicativos, percebi que nas plataformas digitais minha localização não coincidia com o descrito no contrato. No Google Maps, era Rua Nestor Pereira Habkost, mas com numeração diferente da que estava no contrato; no Uber aparecia Rua Antônio Duda e sem numeração específica, assim como no iFood.”
Ao realizar uma pesquisa na base de dados dos Correios, nota-se que a Rua Nestor Pereira Habkost pertence à Araucária. Já a Rua Antônio Duda, é de Curitiba.
João Pedro esclareceu que hoje já sabe que mora na rua Antônio Duda, e acredita que a disparidade quanto ao endereço, somada ao preconceito que a região sofre, faz com que nenhuma das cidades abrace o local.
Quanto a coleta de lixo, havia sido informado para a família de João Pedro que ela aconteceria na esquina da rua em que reside nas sextas-feiras. Não foi essa a realidade encontrada por eles, tendo grandes períodos em que os resíduos acumulam. Já o serviço de reciclagem, o morador diz que não ocorre.
A prefeitura dispõe de um site que diz o dia e a hora que a coleta de lixo reciclável passa no endereço. Quando se busca a Rua Antônio Duda, percebe-se que ela não está na base da coleta. O mesmo acontece para os resíduos comuns.
Mesmo com seus reconhecimentos, Curitiba enxerga de perto problemas comuns ao resto do Brasil. Seja diante de seus olhos, seja distantes do planejamento urbano implantado. O relato de João Pedro Cordeiro ilustra situações vividas por grande parte dessas populações que estão na fronteira entre os municípios. Ora entendem estarem em um bairro da capital, ora em outra cidade. Em ambos os casos, restam desamparados das políticas públicas.