Texto e imagens por Ana Luiza Costa Halat e Nayara Almeida
Quem passa pela rua Desembargador Motta, em frente ao número 2011, pode ficar em dúvida sobre o que se trata aquele ambiente que, de cara, se mostra aconchegante e acolhedor. Por lá, está localizada a Arte & Letra. Café, editora ou livraria? Os três (e mais). O estabelecimento, inaugurado em 2006, é um fruto da junção de habilidades dos irmãos Thiago e Frede Tizzot. Enquanto Thiago é leitor assíduo, escritor e editor de obras literárias, Frede é designer e ilustrador. Em conjunto, os Tizzot administram a editora-livraria-café que está consolidada no cenário literário curitibano.
O cheiro de café se mistura aos livros na Arte & Letra. Não só se estabelece como local de trabalho para aqueles que têm oportunidade de escolher o melhor cenário para produzir, como também é um ponto de encontro para leitores, autores e entusiastas da literatura.
Ao caminhar pelo ambiente, o visitante encontra uma série de livros à venda. Divididos em categorias regionais, premiados e internacionais e longe de estarem restritos aos grandes best-sellers disponíveis em listas pela internet, os títulos dispostos incluem as obras da própria editora e de outras locais e independentes.
“A literatura independente é uma popularização da arte da escrita, de fato. Ler livros de editoras grandes que publicam coisas grandes para um público massivo é bacana, mas não é uma pessoa que você poderia conhecer que está escrevendo esse livro”, como define o estudante Joaquim Palma Ramos, os livros publicados pela Editora Arte & Letra se encaixam na literatura independente. Um exemplo disso é a impressão sob demanda. Na própria sede da livraria há um laboratório gráfico em que Frede monta livro por livro, manualmente, aos olhos dos visitantes do café.

A experiência completa de produção dos livros
Além de livraria e café, a Arte & Letra oferece uma experiência completa aos leitores com o Laboratório Gráfico, local onde são produzidos os livros da editora. Este espaço permite que o público veja de perto todo o processo de criação dos livros, desde a curadoria até os acabamentos finais, tudo feito manualmente.
“Acho que esse é o grande diferencial. No Brasil não tem nenhuma editora que produz os próprios livros e tenha uma livraria com café, que é um espaço aberto ao público”, ressalta Frede. Esse diferencial incentivou os irmãos a iniciarem a editora e publicarem livros que gostariam de ler, mas não encontravam no mercado literário.
Foi o que atraiu Joaquim Ramos para o espaço. “A integração entre cafeteria e livraria é uma combinação ótima, achei isso muito interessante”, relata.

Contrariando a tendência de venda dos livros digitais, a equipe da Arte & Letra optou por valorizar o livro físico e resgatar esse segmento. O livro físico, principalmente em uma edição de qualidade e exclusiva, como o propósito da editora, é o que mais eleva o custo de produção do exemplar.
O processo de publicação começa no escritório da editora, localizado no andar superior da livraria. É lá que os irmãos e os funcionários ficam responsáveis por “ficarem de olho” no que os autores escrevem e no que está sendo lançado.
Ao entrar em contato com os escritores, para discutir os direitos autorais para a publicação, é quando surgem as ideias iniciais para o projeto gráfico da obra, como o número de páginas, capa e impressão. Assim, o projeto vai tomando forma. Somente quando tudo isso é definido que iniciam a produção do livro no Laboratório Gráfico, com a impressão e encadernação manuais. Encerrando o ciclo do livro na livraria, para os leitores poderem comprar.
Cada livro leva cerca de 20 minutos para ser produzido após a impressão, na etapa de produção manual. As edições passam pelas mãos dos funcionários, com dedicação para ser separada folha por folha e, posteriormente, ser realizada a encadernação. Atualmente, a impressão é feita em uma impressora com tecnologia japonesa que simula serigrafia.

A integração dos três segmentos, produção, livraria e café, é uma experiência completa. “A ideia do laboratório gráfico nos dá uma autonomia maior na produção dos livros e serve para que as pessoas vejam a gente fazendo e saibam o que é feito aqui”, relata Frede.
O Laboratório proporciona autonomia para os editores, evitando a terceirização da produção dos livros, já que isso ocorre na livraria mesmo, o que gera, também, um custo menor na produção. Dessa forma, toda a equipe teve que aprender os processos de produção, como a costura dos livros. Atuando em todo o ciclo do livro. Desde a ideia inicial até a finalização com a encadernação.

História
Sendo filhos de professora de português e literatura, Thiago e Frede já cresceram ambientados no meio literário. Ao contrário do irmão, Frede conta que não tinha o hábito de ler muitos livros, buscar autores e ter o desejo de ler a bibliografia inteira de cada um deles, como é comum entre os amantes da literatura. Foi na faculdade de história que publicou o primeiro livro pela Arte & Letra. “Três Cadernos de História, Ideias e Reflexões” foi o projeto acadêmico inicial da editora, que, em seguida, publicou mais alguns até migrar para o literário. Desde então, a editora já lançou mais de 150 histórias, incluindo autores curitibanos e internacionais.
Thiago, apaixonado pela obra de autores como JRR Tolkien, idealizou um universo fantástico que integra os livros “O segredo da guerra”, “A ira dos dragões” e “Três viajantes”. Todos pela Arte & Letra. Ao unir a necessidade do irmão com a sua frustração em ver a pouca valorização do gênero Fantasia no Brasil, abriram oficialmente a editora.

Após os dezoito anos de Arte & Letra, o empreendimento mudou de endereço, expandiu, participou de feiras literárias nacionais e internacionais e é o point de quem se interessa por literatura em Curitiba e, até mesmo, dos turistas da cidade. Em maio deste ano, por exemplo, a livraria foi palco da primeira Feira Literária de Curitiba, a Flicu.
Além da publicação de títulos de autores requisitados pelo mercado editorial curitibano, como Dalton Trevisan e Luci Collin, a Arte & Letra ainda é editora de revistas literárias. O seu primeiro projeto, “Arte e Letra: Estórias”, foi publicado de 2008 até 2015, com 26 edições, uma para cada letra do alfabeto. O objetivo era a publicação de textos, em sua maioria contos, de autores que julgavam importantes de serem lidos, sejam eles conhecidos, estreantes, brasileiros ou estrangeiros.
Com lançamento previsto para agosto, “Julia”*, a nova revista literária da editora, chega com a intenção de criar uma plataforma de destaque para a literatura paranaense. A proposta da revista surgiu com a necessidade de publicar autores desconhecidos, pois os irmãos sentiam uma resistência do mercado literário para a publicação de autores novos. No momento, a primeira edição está em fase de finalização.

Próximos anos
Outros planos para a livraria é o fortalecimento e a presença física nos três segmentos de atuação — produção, livraria e café — e promover eventos literários para atrair cada vez mais visitantes. Além disso, continuar a produção dos projetos e publicação dos livros, como as próximas edições da revista “Julia”. A proposta é realizar um festival literário por ano.
A integração de livraria, café e editora consolidou a Arte e Letra no mercado literário ao longo de mais de dezoito anos. O compromisso com a produção e a criação de edições únicas continuam sendo o foco do projeto, marcam o cenário literário de Curitiba e destacam-se como um pilar na produção literária e expressão cultural na cidade. Agora é ficar atento para o que está por vir.
*No momento em que a reportagem foi finalizada a revista ainda estava em produção. Agora, período de publicação da matéria, você já pode conferir a 1ª edição da “Julia” aqui.