Por Ana Halat e Gabriela Zadvorne
Não pagar nada para se locomover é um desejo de muitos curitibanos. Porém, com a tarifa custando 6 reais, isso parece algo inalcançável. Na Feira de Mobilidade Urbana Sustentável (MUS), que está acontecendo entre os dias 21 e 23 de setembro, na Praça Santos Andrade, em Curitiba, este foi o debate central nesta sexta-feira (22).
A roda de conversa “Transporte Público e Tarifa Zero no Brasil” aconteceu a partir das 16 horas e trouxe lideranças locais, grupos de pesquisa e ativistas da causa para discutir a viabilidade da tarifa zero em Curitiba e quais as implicações desta possível mudança.
O bate-papo iniciou com a apresentação de um formulário sobre o uso do transporte público no município, desenvolvido pelo Grupo de Estudos em Transportes (GET) da Universidade Federal do Paraná (UFPR).

Logo em seguida, o público presente participou com falas que iam desde os benefícios da gratuidade da tarifa, até como conscientizar a população sobre a importância dessa ação e as problemáticas envolvendo a Urbanização de Curitiba – URBS.
A vereadora de Curitiba Professora Josete (PT) participou explicando que existem formas de financiamento para esse sistema. “O dinheiro que o empregador paga como vale-transporte poderia ir para um fundo e financiar a tarifa zero ou, também, taxar com valores pequenos o uso do carro”.
Tarifa zero como aliada da mobilidade urbana
O ponto em comum entre a maioria dos ouvintes foi a possibilidade e necessidade da implantação da tarifa zero em Curitiba. A proposta de financiamento visa aumentar o número de usuários do transporte público e, consequentemente, diminuir problemas de mobilidade urbana causados pelo alto número de carros.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em Curitiba há 1,7 carro por pessoa, o que torna a cidade como 4ª capital com o maior número de veículos per capita do Brasil. Essa alta na quantidade de automóveis nas ruas causa um aumento na emissão de gases poluentes e colabora com congestionamentos, acidentes de trânsito e superlotação das estradas.
A Proposta de Emenda à Constituição n° 74, de 2013, promulgada em 2015, garante o transporte público como direito constitucional, o que contradiz o alto preço da tarifa de ônibus. “Quanto mais aumenta o valor da passagem, menos pessoas utilizam o transporte público. Por conta disso, a tarifa zero seria uma forma da população ter acesso à cidade, ao lazer e aos seus trabalhos com maior facilidade”, defende o estudante de engenharia civil da UFPR e membro do GET, Luiz Felipe Ferreira da Silva.
No debate, também foram apresentados dados que mostram a viabilidade desta mudança. Mais de 70 municípios já aderiram ao programa no Brasil. Dentre eles, estão alguns paranaenses, como Paranaguá, Matinhos, Quatro Barras e Tijucas do Sul.

Em Curitiba, houve queda de, aproximadamente, 45% do número médio mensal de usuários pagantes na Rede Integrada de Transporte (RIT) desde 2015. Esta redução está diretamente associada ao aumento do preço da tarifa. Apenas nos últimos dez anos, o valor da passagem aumentou 7 vezes, de acordo com pesquisadores do GET.
Uma dificuldade na transformação da RIT apontada por Sandro Silva, supervisor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), na conversa, foi a origem do financiamento do transporte público de Curitiba. No município, mais de 80% do financiamento vêm do pagamento da passagem pela população.
Por fim, a roda de conversa debateu sobre a necessidade de mobilização pública e cobrança das autoridades pela efetivação da passagem gratuita ou, ainda, diminuição do valor do transporte público.
Entenda o Sistema Único de Mobilidade (SUM)
Uma das soluções levantadas no debate foi a implantação do Sistema Único de Mobilidade (SUM). A PEC 25/2023 foi inspirada no Sistema Único de Saúde (SUS) e no Sistema Único de Assistência Social (SUAS) e idealizada pelos deputados federais Luiza Erundina (PSOL-SP), Erika Kokay (PT-DF) e Orlando Silva (PCdoB-SP). A proposta tem como objetivo o “Triplo Zero”: zerar a tarifa de transporte, as emissões de CO2 e as mortes no trânsito.
O SUM tem como finalidade o financiamento da tarifa em uma parceria entre o Governo Federal, Estadual e Municipal, trazendo maior inclusão e participação popular nos debates sobre as mudanças no transporte e tarifa, o que diminuiria, também, a desigualdade social e geraria menor impacto no meio ambiente.

O enfoque do programa é o desenvolvimento nacional, já que, devido às implicações políticas, Curitiba teria grande dificuldade na implantação do modelo, que poderia se tornar possível com o apoio da população e a cobrança social para a garantia de um transporte público mais igualitário e acessível. Outro benefício seria a maior integração entre as regiões metropolitanas.
A proposta é defendida por ativistas como Ana Clara Nunes (20), militante do Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores Por Direitos (MTD) e da frente de luta Tarifa Zero Curitiba. “A partir do momento em que foi delegado para os municípios cuidarem do transporte foi um caos, pois eles não têm recursos para subsidiar os transportes com qualidade”.
Tarifa zero X Passe livre
A Tarifa Zero e o Passe Livre têm sido pautados com muita repercussão atualmente, mas pouco se fala da diferença entre os dois. A tarifa zero tem o objetivo de tornar o subsídio da tarifa inteiramente municipal, saindo, assim, sem custo para o usuário e recuperando o uso do transporte público.
O Passe Livre se caracteriza pela beneficiação do Ministério da Infraestrutura, garantindo o uso gratuito do transporte público para pessoas portadoras de deficiência e pessoas com renda familiar de até 1 (um) salário mínimo.
O Passe Livre em Curitiba é algo sonhado, também, pelos estudantes, os quais buscam pela diminuição da tarifa do transporte, mas que não obtém sucesso devido à burocratização, como é o caso de Karina Scariott, frequentadora da feira e usuária do transporte público de Curitiba.
“Estudei por 5 anos e até hoje não consegui o cartão de estudante, pois a URBS dificulta o acesso ao pedir um monte de documentos que ninguém consegue juntar”.
Além de Karina, muitos outros estudantes nunca conseguiram esse benefício, o qual, até hoje, é algo irreal na vida de vários curitibanos.
Feira MUS 2023
A Feira de Mobilidade Urbana Sustentável acontece até o dia 23 de Setembro, na Praça Santos Andrade em frente à Universidade Federal do Paraná (UFPR). O encerramento está previsto para às 18 horas deste sábado (23), com a festa “Resta 1”, que irá ocorrer no Janaíno Bar, localizado na Rua São Francisco, 50, em Curitiba.
As atividades e a programação acontecem em endereços distintos que podem ser acessados pelas redes sociais do evento (@FEIRAMUS).
Confira também a reportagem em áudio, feita por Ana Halat e Gabriela Zadvorne: