Pequena Biografia de Desejos (2011) e O beijo de Schiller (2014) são as duas publicações de Cezar Tridapalli. Curitibano e escritor, é tão apaixonado pela cidade quanto é pelas letras. O primeiro livro já flerta com a literatura, pois narra a história de um porteiro que sonha em se tornar escritor a partir das andanças na Biblioteca Pública do Paraná. A segunda obra, que rendeu o Prêmio Minas Gerais de Literatura ao autor, traz um protagonista que é escritor e foi vítima de um sequestro. A partir daí, o personagem começa a escrever um romance que se mistura com a vida real. As aspirações literárias, o início de tudo, a relação com Curitiba, com os leitores e projetos para o futuro foram contados por Tridapalli para o Jornal Comunicação. Confira:
JC: Qual foi o caminho até você se tornar escritor?
CT: Eu tinha aquela coisa de quase todo adolescente, de escrever poesia, mas não pensava muito sobre isso. O início da minha vida profissional foi bem conturbado e diferente de qualquer coisa relacionada a literatura. Eu me formei oficial do corpo de bombeiros. Logo saí e entrei no curso de Letras, fui professor universitário. Até que depois dos 30, 35 eu falei: ‘poxa, acho que posso tentar também, tenho interesse, tenho algumas ideias, quem sabe?’. Eu era um total desconhecido. E agora já foram dois livros publicados. Eu me encontrei no romance, é o que me dá vontade de escrever.
JC: Os personagens de Pequena Biografia de Desejos e O beijo de Schiller são envolvidos com literatura. São obras com uma pitada de autobiografia?
CT: É mais essa questão do affair com a literatura. Mas não é o tema dos livros. A questão da autobiografia aparece no cenário. Eu sou curitibano, então é o espaço que eu conheço melhor, onde eu vivi. Essa é a maior identificação ali: o lugar por onde eles andam.
JC: O que você mais gosta na cidade? O que menos gosta?
CT: É aquele amor de curitibano. Eu gosto do clima pacato da cidade e um pouco da timidez das pessoas. Acho que ela tem um certo charme. O frio é bacana, é uma cidade moderna e planejada. O ruim é que foi uma cidade que fez muita propaganda sobre si mesmo, jogou muito confete em cima da própria cabeça e vendeu uma imagem que é irreal, pois a gente sabe que a injustiça social e o conservadorismo são muito fortes aqui. Isso me entristece muito.
JC: Como surgiram as ideias das histórias?
CT: Poxa vida, eu nunca sei responder essa! Eu me lembro que O Beijo de Schiller nasceu a partir de um artigo do Orhan Pamuk falando sobre um ensaio do filósofo Friedrich Schiller. Nesse ensaio, ele divide as pessoas em duas classificações: as com uma postura ingênua, que vivem sem refletir sobre a própria vida; e as sentimentais, reflexivas, que são aquelas que ficam pensando sobre os próprios pensamentos, que estão sempre num jogo. Por uma feliz coincidência também é o nome de uma rua perto da minha casa, que é diferenciada, toda arborizada, muito especial pra mim. E o personagem mora lá.
JC: Você é ingênuo ou reflexivo?
CT: Na vida eu sou o reflexivo. Mas o Schiller também fala que essa divisão é uma postura do escritor. E acho que eu tento ser os dois. Eu tento fazer a narrativa andar sem ficar pensando muito sobre ela, mas é interessante você ter uma noção de que você está montando um jogo, que é um romance, e que tem uma série de peças por aí. Eu tento fazer as duas coisas.
JC: Quais são as suas inspirações?
CT: A vida é a fonte de inspiração. Acho que de tudo a gente tira alguma coisa, e aí eu vou anotando as reflexões num bloco de notas e tento dar corpo a isso. Diria que é impossível você ser um escritor sem ser um leitor, eu tenho alguns autores de cabeceira, como o Ian McEwan, por exemplo. A literatura é fundamental. A releitura também é muito importante para o leitor, embora eu releia menos do que gostaria.
JC: E os seus livros? Depois de prontos, você os releu?
CT: De cabo a rabo, nunca. Tenho muito medo de encontrar erros, coisas que seriam impossíveis. Isso nunca aconteceu, ainda bem! Talvez eu até já esteja saturado da história… E há outros autores pra serem lidos, então não vou ficar me lendo! (risos)
JC: Como foi pegar seu livro terminado na mão pela primeira vez?
CT: Acho que, como toda estreia na vida, as primeiras vezes têm um significado especial. Seja pegar na mão de uma menina pela primeira vez, ou lançar um livro. Porque eu pensava ‘será que eu posso mesmo?’. Eu tinha esse fetiche de ter o objeto livro na minha mão, então foi um momento muito marcante, especial e que me deu mais confiança pra seguir.
JC: Se você pudesse ser um dos seus personagens, quem você seria?
CT: Nenhum! Não tem nenhum personagem ali que se aproxima do meu ideal de ser humano. O primeiro, eu tenho muita pena dele. É um personagem muito triste, muito sofrido. E o segundo é mais arrogante, autossuficiente, que acha que sabe tudo. Então, nenhum deles!
JC: Quais são seus seus planos daqui pra frente?
CT: Tenho um terceiro romance começado, mas dá azar falar sobre ele! (risos) A ideia é terminar a primeira versão esse ano, depois revisar pra, se tudo der certo, lançar em 2017.