Entre as muitas formas utilizadas pelas universidades públicas para compartilhar os conhecimentos produzidos nos campi com a população, uma dos mais eficientes sem dúvida é o projeto de extensão. Este tipo de iniciativa é caracterizado pela colaboração entre professores, técnicos administrativos e alunos em alguma atividade direcionada para o benefício de alguma área da sociedade, proporcionando uma interação direta entre a instituição e o povo.
Um desses projetos é o “Mundo Mágico da Leitura” (MML), vinculado ao curso de Licenciatura em Artes do campus da UFPR em Matinhos, litoral do Paraná, e desenvolvido nas escolas públicas da cidade. Iniciado em 2008, o projeto foi concebido para apoiar o trabalho com a leitura já desenvolvido pelas escolas, e por isso, foi idealizado para se aproveitar de estratégias mais diferenciadas, utilizando aspectos lúdicos como teatro, contação de histórias, música e interação com os alunos para tornar os textos mais atraentes e interessantes para o público jovem.
Hoje, com mais de 10 anos de atuação, o projeto se tornou um programa de extensão da universidade, e continua presente nas escolas de Matinhos com duas atividades principais: sessões de leitura, e dramatização de textos (utilizando recursos como teatro e bonecos), executadas com turmas da educação infantil e ensino fundamental de várias escolas da cidade. Entre 2012 e 2019, o MML realizou mais de duas mil dessas ações.
Para uma das coordenadoras do programa, a pedagoga Rosangela Valachinski Gandin, estes recursos acabam tornando a compreensão do texto mais fácil para as crianças. “A compreensão surge da interação da criança com o texto. Na medida que nossos acadêmicos, que estão aprendendo a ser mediadores de leitura, fazem perguntas, eles incentivam as crianças a refletir sobre a história. Dessa forma, elas conseguem compreender o texto mesmo ele sendo falado por outra pessoa”, explica ela.
Formando leitores e educadores
As atividades do programa também acabam trazendo benefícios para a experiência dos estudantes com a leitura, com muitos despertando o prazer pelos livros após entrar em contato com o MML. Estas informações são coletadas pelos acadêmicos por meio de avaliações somativas realizadas no final do ano letivo com as crianças, onde elas possuem um espaço para comentar o que acharam da experiência.
Dessa forma, os integrantes do programa também podem entender quais estratégias cativam mais as crianças, e adequar as atividades futuras com base nestas percepções. Resultados de 2018 destas avaliações, por exemplo, coletados de uma amostra de 10% dos 1700 crianças atendidas no ano, revelaram que as perguntas durante as histórias são apreciadas pela maioria dos alunos.
Os textos disponibilizados pelo programa também acabam beneficiando a experiência em sala de aula, como relata a professora Marinise Santos da Silva, da Escola Municipal Francisco dos Santos Jr.: “Nós conseguimos aproveitar o material do programa durante as aulas, fazendo atividades como fichas de leitura, que ajudam na produção textual dos alunos”.
E as interações positivas com o programa não se restringem às crianças e aos adolescentes. Para os acadêmicos que se voluntariam para o programa, os conhecimentos adquiridos pela preparação das atividades de leitura e pelos cursos de extensão oferecidos pela coordenação acabam agregando habilidades que não costumam receber destaque em formações acadêmicas tradicionais. Os mediadores e atores que apresentam os textos junto aos alunos conseguem trabalhar dinâmicas de ensino diferenciadas com os estudantes, e aplicar a criatividade para imaginar novas formas de tornar os textos engajantes.
“Ao mesmo tempo que a gente percebe que os nossos materiais trazem um desenvolvimento positivo para as crianças, nós percebemos uma melhoria também entre os bolsistas e voluntários que participam do programa. São observados desenvolvimentos em áreas como a produção textual e nas metodologias de ensino, que acabam sendo internalizadas por eles para uso nas aulas e até nos estágios obrigatórios”, relata a professora de Artes Luciana Ferreira, que também coordena o MML.
Novos formatos
Mesmo com as restrições da pandemia do covid-19 impedindo a realização de atividades presenciais, o programa não parou com os trabalhos. Desde 2020, os integrantes do Mundo Mágico começaram a adaptar as histórias em formato de vídeos, disponibilizados gratuitamente nas redes sociais do programa, como o canal do Youtube, a página do Facebook e a conta do Instagram.
Ao todo, o MML publicou 50 vídeos nos anos de 2020 e 2021, a maioria no formato de sessões de contação de histórias gravadas pelos integrantes do programa, além de alguns outros formatos novos, como uma pequena animação para adaptar o conto de Pedro Bandeira “A onça e o saci”. Apesar da grande maioria dos materiais ser baseada em contos infantis, alguns dos vídeos também adaptam outros subgêneros literários, desde fábulas como “A lebre e a tartaruga”, histórias mitológicas como “O mito da caixa de Pandora” e a lenda cigana “O barco”.
Para este ano, o MML também já possui alguns vídeos em produção, com formatos e gêneros literários ainda mais diversificados. Eles incluem o conto da mitologia nórdica “O roubo do Martelo de Thor”, a lenda local do litoral do Paraná “A lenda da caveirinha”, a sessão de leitura compartilhada do haicai “Hai quintal” e o conto de enigma “A quase morte de Zé Malandro”, adaptado no formato de teatro de sombras. A publicação destes materiais será iniciada a partir do segundo semestre de 2022, nas páginas do programa.