Ter liberdade e maturidade para falar sobre uma doença é o primeiro passo para tratá-la. Pode parecer irreal, mas a sentença se torna verdadeira quando pensamos no alto índice de mortes relacionadas ao câncer de próstata decorrentes do desconhecimento e do puro preconceito. Segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA), a fatalidade é a segunda principal causa de morte entre homens no Brasil. Uma estimativa aponta que um a cada seis homens desenvolverão a doença. Destes, um em cada trinta e seis corre o risco de morrer dela.
Aqui, a incidência de câncer de próstata é maior que a de câncer de mama – 60.180 casos contra 52.680 em 2012/2013. A sensação oposta nos vem porque campanhas, cartilhas e debates sobre a doença das mamas são frequentemente veiculados em diversas mídias e grupos. O assunto é tema de discussões e raras opiniões se põem contra o exame preventivo. Isso porque não é estranho uma mulher se tocar ou ser tocada. Quanto ao toque retal essencial para o diagnóstico do problema urológico, a questão é “mais embaixo”. Pesquisas revelam que apenas 32% dos homens dizem já ter feito o exame que dura poucos segundos. Os motivos da recusa são vergonha e machismo.
Machismo como motivo
A sociedade machista tem feito suas vítimas também entre os homens. Submeter-se a um exame de toque coloca, supostamente, em dúvida a virilidade e a masculinidade. É visto como vergonhoso e desnecessário. Mas a doença possui uma evolução silenciosa. São poucos os sintomas em sua fase inicial e, quando eles aparecem, o câncer já alcançou o estágio avançado. Médicos concordam que cerca de 90% podem ser tratados com sucesso quando diagnosticados a tempo. E aí está a extrema necessidade do teste preventivo.
Parece que o exame atesta muito mais que a existência do câncer de próstata. Põe em prova seu esclarecimento e seu raciocínio. É uma questão matemática: parece absurdo desperdiçar um resto de vida por um desconforto de poucos segundos. E é.
Mas a culpa pelos altos índices de câncer de próstata não recai apenas sobre os que se recusam a fazer o exame preventivo. Se deve, principalmente, aos que espalham o preconceito como uma epidemia, venha ele na forma que vier. Diretas ou veladas através de piadas, as críticas insensatas reforçam a vergonha de realizar o teste, quando, na verdade, vergonha mesmo é cultivar a ignorância.
Piada fúnebre
A infame piadinha do dedo é uma prova de que quem está opinando pouco conhece sobre os riscos que o câncer de próstata – e qualquer outro câncer, parece – pode trazer. Um assunto tão sério que ocasiona em torno de 20 mil mortes por ano não é engraçado. Câncer não é engraçado. Que procure um psicólogo quem acredita o contrário.
Deixe crescer
Como meio de acabar com o desconhecimento e tirar a doença da lista de tabus, todo o mês de novembro foi “doado” à causa do câncer de próstata, do câncer testicular e da saúde mental. A época ganhou nome e cor e, aos poucos, também ganha a atenção do público.
Com o nome de “Movember” – uma divertida mistura de “mustache” e “november” – o movimento incentiva homens a deixarem seus bigodes crescer ao “estilo Mario Bros” em um desafio que pede maiores cuidados com a saúde masculina. O Novembro Azul tem as mesmas pretensões que seu antecessor, o Outubro Rosa, visando atrair olhares para uma causa mais que nobre.
Os efeitos da brincadeira ainda não foram atestados, mas, ao passo que o Movember vai multiplicando os bigodes, certamente vai reduzindo o número de homens que nunca foram a um Urologista – que, acreditem, beira os 50%, de acordo com pesquisas.
E, ainda que não se vejam muitos barbados conscientizando por aí, o Novembro Azul trouxe às claras um assunto que era timidamente tratado – quando tanto. Arrastou o tema para debate e publicizou seus tópicos. Assim, ainda que a atitude não tenha o poder de combater o câncer, pouco a pouco, bigode a bigode, o assunto vem às claras e fica tão visível quanto uma barba no rosto.