A mídia brasileira não mostra a realidade da Colômbia

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Quem possui internet com certeza já ouviu falar da série Narcos. A série, produzida pelo Netflix, conta a história de Pablo Emílio Gaviria Escobar (Wagner Moura) e do narcotráfico na Colômbia dos anos 80. Muito bem produzida e com um ótimo roteiro, é considerada por alguns uma das melhores séries dos últimos tempos. Porém, ela peca em um quesito fundamental onde tantos outros programas da mídia pecam: a representação da Colômbia e o reforço de estereótipos.

A professora de comunicação social da Universidad Santa Fe e doutoranda em sociologia na UFPR, Claudia Gordillo, é colombiana e ficou assustada quando uma amiga aqui no Brasil perguntou se todos na Colômbia amam Pablo Escobar. ‘’Não, nós não amamos Pablo Escobar. Ele fez algumas coisas boas para Colômbia como construir bairros para populações carentes, mas criou milícias e gangues que continuam matando inocentes mesmo depois que ele já morreu’’, explica.

Normalmente, as únicas referências que os brasileiros têm da Colômbia são as que adquirem na escola – onde os principais assuntos estudados são os europeus, a Colômbia não é abordada por mais de um tópico –  e os que vê na mídia -onde os jornais só retratam as guerrilhas colombianas e as inúmeras vítimas.

A mídia brasileira é muito voltada para questão dos Estados Unidos e Europa e acaba deixando a América Latina de lado. Em telejornais, não faltam notícias desses outros continentes, mas nossos países vizinhos – Chile, Colômbia, Paraguai, Uruguai, Venezuela – passam despercebidos.

E não se resume apenas a coberturas midiáticas. ‘’Na academia [universidade] brasileira temos um contato enorme com autores europeus e alguns norte-americanos, enquanto os ótimos trabalhos latinoamericanos que estão sendo realizados são ignorados’’, afirma Gordillo.

Política na Colômbia

A situação política na Colômbia é muito mais estável que na época de Pablo Escobar. Segundo o professor Fernando Diaz Colorado, os anos 1980 e 90 ficaram conhecidos como a época do terror. ‘’Existiu uma guerra frontal contra o partido político UP (Unión Patriótica), de tendência esquerdista, feita pelos narcotraficantes e militares corruptos, o que ocasionou a morte de quatro candidatos à presidência’’, explica Colorado.

Atualmente a situação política está centrada pelo confronto de posições do presidente Santos de negociar com as FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), e do ex-presidente Alvaro Uribe, que não apoia a negociação. Segundo o professor, os guerrilheiros não tem exercido influência política de importância na Colômbia. ‘’Suas ações tem sido mais de ordem militar, com ações de violação dos direitos humanos e de caráter terrorista’’, afirma.

Diaz ainda complementa que ‘’ existem alguns municípios em que as autoridades são as FARC, mas sua ação política tem sido muito pobre. o povo colombiano, na sua maioria, não considera as FARC como um representante político válido’’.

Representação em imagens

A tese de doutorado da professora Claudia Gordillo disserta sobre a representação do fotojornalismo sobre as vítimas do conflito armado na Colômbia. Segundo a professora, a preferência pelo tema veio porque as fotos mostram muito mais do que o texto quando descrevem uma vítima. ‘’Muitos pesquisadores na Colômbia pesquisam a matéria, o textual, e se esquecem da imagem, acham que ela está lá só para decorar. A imagem contém o que o texto não poderia descrever’’, afirma.

A professora está moldando um novo conceito, o conceito de ‘’vítima-objeto’’. Esse conceito serve para mostrar como os registros fotográficos podem reforçar certos estereótipos e contribuírem para a perpetuação da violência. A vítima, do confronto armado, é vista como um mero objeto pela mídia que precisa vender a notícia. Não há uma discussão e nem um uso consciente da foto, a pessoa é usada como um objeto ilustrativo e decorativo. ‘’É colocar a vítima porque é do meu interesse, para promover a venda do jornal’’, explica Gordillo.

Uma das hipóteses levantadas pela pesquisadora diz respeito ao motivo dessa representação pelos fotógrafos. Na primeira etapa da pesquisa, ela conversou com 10 fotojornalistas e descobriu que os principais motivos para esse tipo de representação são a falta de tempo e a linha editorial dos jornais. ‘’Eles produzem um recorte da realidade,acrescentam e usam elementos para deixar a imagem mais triste ou mais impactante. Organizam a imagem de acordo com o queestão imaginando ideologicamente que o editor do jornal precisa, que o dono do jornal precisa’’, conclui Gordillo.