qui 18 abr 2024
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Alcançando as estrelas

Físico formado pela UFPR, Felipe Braga-Ribas participou, aos 31 anos, de uma descoberta que contribuiu para o avanço da astronomia mundial. Ele é um dos profissionais envolvidos na descoberta dos anéis do Centauro Chariklo, corpo celeste menor localizado no Sistema Solar. Antes do achado, apenas os planetas Júpiter, Saturno, Urano e Netuno eram conhecidos por possuírem tal característica.

Foi no ano passado, quando o astrônomo compôs uma equipe formada também por pesquisadores do Observatório Nacional e Observatório do Valongo (UFRJ), do Observatório de Paris e do Instituto de Astrofísica de Andalucia (Espanha), que os anéis de Chariklo foram revelados. Agora, Ribas conta sobre a descoberta e sobre sua vida acadêmica em entrevista para o Jornal Comunicação.

Jornal Comunicação: Primeiro, precisamos entender mais sobre o objeto do estudo. Quais são as “propriedades” do Chariklo?

Felipe Braga-Ribas: Chariklo é um corpo menor do sistema solar e, devido à região que orbita, é classificado como Centauro. Não é um asteroide, apesar de terem características físicas semelhantes. Ele tem uma órbita instável entre Saturno e Urano, tem cerca de 250 km de diâmetro. Sua superfície é escura e não possui gelo de água sobre ela.

O Centauro Chariklo tem aproximadamente 250 km de diâmetro e já foi comprovada a existência de água e gelo em seus anéis (Divulgação/ESO)

Jornal Comunicação: Como foi feita a descoberta? Ela foi inusitada?

Felipe Braga-Ribas: A equipe da qual faço parte lidera uma pesquisa que visa obter as propriedades físicas de objetos que orbitam além da órbita de Netuno, os chamados “Objetos Transnetunianos”. Fazemos isso através de métodos que consistem em observar de lugares diferentes, simultaneamente, o exato momento em que determinado objeto passa em frente a uma determinada estrela. Nós conseguimos precisar o tamanho e a forma do objeto, medindo a duração desse momento. Com isso conseguimos calcular propriedades da superfície e do interior do corpo com precisão. Estas propriedades são fundamentais para conhecer a história da formação destes objetos e, por consequência, do Sistema Solar.

No dia 3 de Junho de 2013 realizamos uma campanha para observar uma ocultação estelar promovida pelo Centauro Chariklo. As observações mostraram que, além da ocultação pelo próprio objeto, a estrela também foi ocultada por algo fino e denso ao redor dele. Assim, descobrimos o primeiro sistema de anéis ao redor de um pequeno objeto do Sistema Solar.

JC: Como é possível que ele possua anéis, indo contra o que muitos astrônomos acreditavam, sendo um corpo celeste menor?

RIBAS: Anéis só eram conhecidos ao redor dos quatro planetas gigantes, então pensava-se que a origem pudesse estar ligada a grandes massas. Mas nunca houve uma teoria dizendo que eles não poderiam existir ao redor de pequenos corpos. Interessante notar que os mesmos mecanismos físicos utilizados para estudar os anéis dos planetas gigantes se aplicam aos de Chariklo.

JC: Qual a importância que a descoberta tem e de que forma pode ajudar o campo científico?

RIBAS: O ser humano está sempre querendo conhecer o mundo à sua volta e, de certa forma, é isto que fazemos na ciência. O diferencial deste tipo de descoberta, é que, a partir dela, um objeto completamente novo e inesperado passou à ser conhecido pela humanidade. Agora muito há para se compreender sobre a formação e manutenção deste objeto.

O astrônomo curitibano participa de uma equipe que pesquisa objetos que orbitam além da órbita de Netuno (Acervo pessoal)

JC: E para você, profissional e pessoalmente, qual a importância e significado de ter não só participado, mas chefiado uma descoberta como essa? Sua vida profissional mudou depois disso tudo?

RIBAS: Um colega uma vez comparou uma publicação feita numa revista tão importante quanto a “Nature” com a conquista de uma medalha de ouro olímpica, a diferença é que a publicação é assinada por vários co-autores. No lado profissional, tenho sido convidado para dar várias palestras em congressos nacionais e internacionais, o que expõem o reconhecimento da comunidade científica.

JC: Os nomes dados aos dois anéis, Oiapoque e Chui, são bem curiosos e diferentes. Qual foi o motivo de escolher o nome de dois rios para batizá-los? E qual a origem do nome do centauro?

RIBAS: Oiapoque e Chui são rios que fazem fronteira com a França – Guiana Francesa – e com o Uruguai, países que participaram da descoberta. Por isso, achamos a ideia adequada. Na mitologia, Chariklo é uma ninfa que foi esposa de Chiron, um centauro. Como os objetos dessa região são classificados como centauros, procura-se nomeá-los a partir desses personagens mitológicos.

JC: Vocês continuaram trabalhando no objeto depois de descobertos os anéis? Especula-se que ele possa possuir um satélite. Isso está sendo verificado?

RIBAS: Continuamos, sim. Já observamos novas ocultações, que revelaram propriedades mais detalhadas dos anéis. Além disso, confirmamos a presença de gelo de água neles. Recebemos tempo no telescópio espacial Hubble para observar o sistema, assim teremos a oportunidade de buscar por satélites ao redor do Chariklo.

JC: Um pouco sobre sua vida acadêmica na UFPR. Você acredita que a estrutura do curso e da Universidade foi uma boa base e um diferencial para sua vida profissional atual?

RIBAS: Não há dúvidas de que tive uma ótima experiência na UFPR. Foi lá que tive meus primeiros contatos com a vida acadêmica e profissional, e com a pesquisa. O ambiente universitário do Centro Politécnico nos permite entender a importância da Universidade e da pesquisa para a sociedade.

JC: Sua formação como físico pela UFPR contribuiu para os resultados que você já obteve hoje? Você teve um bom apoio para o profissional que se tornou?

RIBAS: Sem dúvida, ela me deu a base de conhecimento e critério para poder fazer pesquisa. A astronomia não é uma das principais áreas de pesquisa do departamento de física da UFPR. Ao menos na minha época – e acredito que isso se mantenha –, o único professor pós-graduado em astronomia era o Professor Dr. Dietmar Foryta. Com ele fiz disciplinas optativas de Astronomia e Astrofísica, que me levaram a seguir nestas áreas.

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