As manifestações que ocorreram no ano passado geraram preocupação no governo brasileiro. O temor é de que os protestos interfiram na Copa do Mundo e também nas Olimpíadas de 2016. Com os olhos do mundo voltados para o Brasil, surgem propostas preventivas para inibir atos que possam deixar o país “mal visto” no âmbito internacional.
Nesse contexto, dois projetos de lei tramitam no Congresso Nacional. Um deles pretende especificar quem pode ser considerado terrorista, algo que não existe na legislação atual. O outro torna mais rígidas as punições para quem cometer atos de vandalismo. Além dos projetos, que ainda não foram aprovados, a Fifa determinou uma medida de segurança: os estádios possuirão um perímetro pelo qual manifestações não poderão passar. As proposições e a medida geraram polêmica. Alguns consideram que elas podem ferir o direito de ir e vir e também criminalizar protestos.
Protestar é terrorismo?
O projeto de lei número 499 foi produzido por uma comissão mista (com deputados e senadores), presidida pelo senador Romero Jucá (PMDB/RR) e pelo deputado Cândido Vaccarezza (PT/SP). O texto considera terrorista aquele que provocar pânico generalizado e que ameaçar a vida ou a integridade física de outra pessoa. São enquadrados na lei também aqueles que praticarem terrorismo contra coisa, incitação, formação e financiamento de grupo terrorista. A proposta estabelece condenações que variam de 15 a 30 anos de reclusão.
Totalmente contra a aprovação da chamada lei antiterrorismo, o senador Álvaro Dias (PSDB/PR) considera o projeto desnecessário, falho e atropelado. Para ele, a proposição visa atender aos interesses da Fifa. “Isso fere a nossa soberania. É uma forma de desestimular a participação das pessoas em manifestações de descontentamento”, comenta. O senador também critica o texto por considerá-lo impreciso. “É necessário definir bem o conceito antes, porque o termo é muito complexo para ser abordado dessa forma”, diz.
Penas mais duras
A segunda proposta polêmica é de autoria do senador Armando Monteiro (PTB/PE). O projeto de lei número 508 de 2013 estabelece mais rigor na punição para os considerados vândalos, com penas entre 4 e 12 anos de prisão.“As penas são muito brandas, quase um incentivo a essas práticas. Então há a oportunidade de fazer uma gradação das punições que possa corresponder à extensão e à dimensão do dano decorrente dessa conduta”, explicou Monteiro em entrevista para a TV Senado.
Vice-diretora do departamento de ciências jurídicas da UFPR, Vera Chueiri explica que a possibilidade das propostas ferirem direitos constitucionais existe. “Tudo o que impede que o movimento se expresse tira seu direito de livre manifestação, o que é contra a Constituição”, diz. Para ela, a tentativa é de dar a sensação de segurança por meio da força repressiva do Estado. “Achar que iniciativas como essas vão demonstrar nossa estabilidade é uma ilusão”, completa.
Para o senador Álvaro Dias, não é necessário criar mais leis para garantir o bom andamento dos jogos. “Nós temos os instrumentos para poder tomar as providências”, opina.
Barreiras nos estádios
A iniciativa da Fifa foi de impor perímetros de segurança ao redor dos estádios, para que não ocorram manifestações nas imediações das sedes dos jogos. Segundo Vera Chueiri, os perímetros de segurança afetam o direito de ir e vir do cidadão. No entanto, ela explica que, se um movimento social impede alguém de entrar no estádio, os manifestantes também estão ferindo esse direito.
Na opinião do professor de sociologia da UFPR Ricardo Costa, mesmo protestos pacíficos não podem ferir os direitos de outros cidadãos. “É preciso ter bom senso. Os perímetros são vistos como um ato de segurança”, diz.
Para os que protestam a questão não é tão clara assim. De acordo com André Feiges, que participa de manifestações, o objetivo da decisão é evitar conflitos entre manifestantes e torcedores. “A violência é a forma que alguns usam para conseguir chamar a atenção, uma tática para mostrar seu descontentamento. As pessoas usam esse recurso quando se sentem violadas”, defende.