Ao caminhar pela Rua XV de São José dos Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba, uma construção salta aos olhos. Localizado no Palacete Ordini, ao lado de uma antiga agência dos Correios e de uma atual loja de roupas: é ali o Museu Atílio Rocco, que recebe cerca de 300 visitantes todo mês. Atualmente, a fachada exibe uma faixa de comemoração pelo centenário de seu fundador, o funcionário público Ernani Zétola.
Filho de imigrantes italianos, Ernani nasceu em 1921 e integrou a primeira geração de brasileiros da família. Hoje, é praticamente impossível falar de cultura em São José dos Pinhais sem esbarrar em seu nome. “Eu costumo dizer que, se não tivéssemos Ernani Zétola, hoje não teríamos cultura em São José”, afirma o atual secretário de Cultura do município, Marcelo Dal Negro.

Em 89 anos, Ernani desenvolveu ações como o Centro Cultural Schafemberg de Quadros, em homenagem ao poeta são-joseense homônimo, o Museu Temporário da Cidade, uma exposição que durou duas semanas, e a fundação de um grupo de cultura italiana que participaria do Festival Internacional de Culturas anos mais tarde.
Além disso, fundou o Museu Atílio Rocco, nomeado inicialmente Museu Municipal de São José dos Pinhais, em 1977.
“O Museu nasceu em Ernani Zétola durante a infância, quando fez uma visita ao Museu Paranaense pela escola. Aquela foi a semente para ele querer contar as histórias são-joseenses”, afirma João Alves, funcionário do Museu.
No começo tudo era feito com simplicidade. O museu temporário, por exemplo, foi realizado com ajuda de amigos, e Ernani foi de casa em casa pedir por objetos para a exposição. Funcionário público dos Correios, ele conciliava o trabalho com a promoção cultural da cidade, organizando óperas, teatros e exposições. Até que conseguiu realizar seu maior sonho: fundar um museu na cidade.
Museu Municipal de São José dos Pinhais
Na década de 1970, quando foi fundado, o espaço se chamava Museu Municipal de São José dos Pinhais, como era do desejo de Ernani. Entretanto, alguns anos mais tarde, a prefeitura o tornaria Museu Atílio Rocco, mudança essa que revoltaria seu idealizador. Isso porque, de acordo com o historiador Luciano Chinda Doarte, autor da biografia de Ernani, o homenageado não tinha sequer ligação com a cultura – e nem com o Museu.
“Ernani ficou profundamente magoado e, inclusive, pediu demissão do cargo da direção do Museu. Ele carregou essa mágoa para sempre. Menos de 30 dias antes de falecer, ele deixou uma nota em que celebrava a fundação do Museu, na qual escreveu: ‘OBS: Museu Nacional de São José dos Pinhais, como foi nomeado na lei de 1977’. Ou seja, ele ainda se ressentia”, afirma Luciano.

Até hoje o tema é um tabu na cidade. Existem aqueles que acreditam que o Museu sempre teve o mesmo nome desde a sua criação e não desejam a mudança. Outros lutam pela reparação, em nome de “seu” Ernani. E outros ainda nem sequer comentam sobre o assunto, com medo de ofender o ex-prefeito Moacir Piovesan, responsável pela troca do nome original e que ainda é morador da cidade.
O papel social
Assim como Ernani, grande parte da população de São José é descendente de imigrantes europeus, que, de acordo com Luciano, foram eleitos “cidadãos ideais do Brasil” na década de 1960. A limitação material e o contexto de criação dos museus, segundo o historiador, não escaparam ao Museu Atílio Rocco – que priorizou os povos europeus aos negros, mulheres e indígenas durante anos de sua existência.
Na época de Ernani, o racismo era menos discutido do que na atualidade, o que não justifica o apagamento das figuras negras da história. Por outro lado, como reforça Luciano, os museus no geral envolvem complexidades com relação aos povos à margem da sociedade, devido ao seu contexto de surgimento.
A partir de 2010, a entidade passou a rever a abordagem sobre as minorias sociais. Antes representados na história da cidade apenas como escravizados, o Museu busca realizar exposições sobre a potência e a cultura da população preta, a fim de reaver seu papel como construtora da cultura de São José. Um dos eventos organizados no Atílio Rocco é a Semana da Consciência Negra, realizada no mês de novembro.
44 anos de Museu Atílio Rocco




Mais do que um espaço de exposições, o Museu Atílio Rocco possui mais de 7,2 mil itens de seu acervo digitalizados, dentre fotografias, documentos e jornais de São José dos Pinhais. “O espaço é uma fonte de pesquisa sobre a cidade. Seu acervo é rico e permite compreender os aspectos social, político e histórico de São José”, explica a historiadora Maria Angélica Marochi.
O Museu desperta a curiosidade não só de visitantes de fora, mas também da população do município. Em uma manhã de sexta-feira (10/12), Mariane Herbele aproveitou que estava no centro para levar os filhos Jellinger e Wellinger, de 8 e 10 anos, para conhecerem o espaço.
“Eu adoro história, assim como o pai deles, e os dois acabaram desenvolvendo amor por antiguidades também. Por causa da pandemia, demorou um tempo para eu poder trazê-los aqui”, relata Mariane. Para Jellinger e Wellinger, ir ao museu é “muito legal”. “Viemos para saber a história e ver algumas coisas antigas”, contou o mais velho.
Atualmente, existem cinco exposições disponíveis nos dois andares do edifício, com temas diversos: 100 anos de Ernani Zétola, Olimpíadas, industrialização em São José dos Pinhais, Consciência Negra e Força Expedicionária Brasileira (FEB). Além disso, existe uma sala nova, inaugurada recentemente, que apresenta a história do Aeroporto Internacional Afonso Pena, localizado na cidade.
É possível conferir as exposições fisicamente ou também por meio de uma visita virtual. Clique aqui para acessar a ferramenta.
Serviço
Museu Atílio Rocco
Rua XV de Novembro, 1660. 83.005-000 – Centro. São José dos Pinhais- PR
Aberto de 3ª a 6ª feira – das 8h às 12h – 13h às 17h
Sábados das 12h às 16h