A Secretaria de Estado da Educação do Paraná (Seed-PR) publicou, no dia 10 de outubro, uma instrução normativa conjunta que determina limites para o uso de aparelhos eletrônicos em salas de aula da rede estadual. A norma estabelece regras que definem, de forma padronizada, as maneiras de agir ou não agir com relação aos celulares e outros equipamentos eletrônicos nas 2.091 escolas do estado. 

O documento estabelece dez instruções que promovem o uso consciente da tecnologia para atividades pedagógicas, com autorização prévia, além de prever ações restritivas e punitivas caso as regras nãos sejam cumpridas. A elaboração do documento levou em conta o impacto negativo que o uso inadequado dos celulares pode causar no desempenho acadêmico dos alunos e a necessidade de disciplinar esse uso no ambiente escolar, de forma a garantir a qualidade do ensino e o bom aproveitamento das aulas.  

Infográfico normas. Arte: Isadora Kovalczuck 

Em relação às medidas disciplinares, em caso de um primeiro descumprimento das normas por parte dos alunos, a instrução indica advertência verbal do professor e registro na ficha individual do aluno. Na segunda ocorrência, o documento instrui a convocação dos pais ou responsáveis do estudante para reunião com a equipe pedagógica. Já no terceiro descumprimento, ocorre a assinatura, por parte dos pais ou responsáveis, de um termo de ciência em relação à conduta do estudante, tornando o aluno sujeito a sanções previstas no Regime Escolar.  

A professora Raquel Borges, do colégio estadual Angelo Trevisan, concorda com as instruções, afirmando que elas são coerentes e ajudam na prática. “Já existia uma lei federal que proibia o uso, mas não uma normativa de como fazer isso. Tinha uma lei do MEC [Ministério da Educação], uma lei orgânica do estado e uma lei orgânica municipal, e agora essa normativa surgiu para mostrar de que forma a lei deve ser seguida”, afirma. 

“Achei perfeito, era necessário, chegou tarde”

Raquel Borges, professora da rede estadual 

Segundo a professora, os aparelhos eletrônicos em sala de aula geram atritos desnecessários, causados pelo uso indiscriminado, com jogos fora de hora e comunicação pelas redes sociais. Muito tempo de aula é perdido. Para ela, as normativas facilitaram a diminuição desses comportamentos. “Achei perfeito, era necessário, chegou tarde”, comenta. 

No entanto, Raquel também vê benefícios dos celulares, quando usados de maneira correta e conveniente. “Eles são fonte de pesquisa, promovem acessibilidade à informação, permitem a busca por sites educacionais, aplicativos de aprendizagem e pesquisas técnicas”, explica.  

Aplicação das instruções 

Os critérios já vêm sendo incorporados pelas escolas estaduais. Segundo Raquel, no colégio onde atua, eles estão gradativamente sendo inseridos nas rotinas de sala de aula, mas ainda encontram certa resistência dos jovens, principalmente entre os alunos do ensino médio, mesmo que a maioria aceite. “[Desde antes da lei] eu sempre tive que mandar desligar, mas antes o problema era que os alunos não acatavam por desconhecerem as leis.” 

Ela afirma que a obrigatoriedade imposta pela instrução facilita a adesão dos professores e ensina os alunos a etiqueta de usar o celular durante a aula. 

Professora Raquel Borges e o aluno Renan Gava. Foto: Vitor Beninni 

O estudante Renan Gava, do terceiro ano do Ensino Médio, conhece as instruções e relata que a maioria de seus professores apresentaram ou mencionaram os critérios em sala de aula. Ele percebe que grande parte dos alunos se distrai com o celular, mas afirma que as novas instruções normativas “vieram reforçar [as leis anteriores], porque chegou em um ponto em que tanto alunos como professores não aguentavam mais”. 

O estudante conta que começou a levar o celular para o colégio devido ao uso das plataformas, cada vez mais recorrentes no ensino público. “Às vezes não há disponibilidade de tablets e computadores no colégio, então alguns alunos precisam acessar as plataformas pelo celular.”  

Para Renan, o uso não deveria ser proibido, visto que atualmente o celular é necessário pela grande quantidade de plataformas que orientam as atividades de ensino e aprendizagem. Contudo, concorda que exista algum tipo de restrição. “Acho que proibir é muito forte, mas esse ‘ficar de olho’, ter essa vistoria para não acontecer nenhum problema, deve ser mais rígida, porque geralmente dá problema.” 

Plataformização do ensino 

Caracterizado pelo uso massivo de aplicativos e programas para a gestão pedagógica, a plataformização da educação é um fenômeno que vem crescendo nos últimos anos. Tais serviços alteram as formas de disseminar e absorver o conteúdo de ensino. 

A incorporação de plataformas nas rotinas educacionais, como a “Leia Paraná” e a “Inglês Paraná”, impulsiona o processo, aumentando a necessidade dos aparelhos, dentro e fora de sala para o cumprimento de atividades pedagógicas. Isso também proporciona a diminuição do papel dos docentes dentro de sala, que dividem a atuação com a lógica de ensino imposta pelas plataformas.  

Esse método de ensino, apoiado por plataformas, divide opiniões. Para alguns, as plataformas são vistas como um auxílio na educação, proporcionando acessibilidade, praticidade e multiplicidade de conteúdos concentrados em um só lugar. Para outros, elas são percebidas como prejudiciais ao aprendizado. Além disso, a dependência cada vez maior dos aparelhos digitais vem sendo vista como um problema em ascensão. 

“A gente precisa diminuir a plataformização”

Raquel Borges, professora da rede estadual 

Para a professora Raquel Borges, “a plataformização é restritiva em relação ao desenvolvimento cognitivo do estudante”. No colégio onde atua, ela observa tais limitações em disciplinas como redação e cálculo, em que muitas atividades se dão em ambientes virtuais, e a grande quantidade de tempo de tela deixa os alunos cansados. 

Para ela, a educação não pode ser feita apenas em plataformas. “Se a gente quer reduzir a quantidade de horas de tela para que o aluno possa pegar um livro e ler, dar sua própria opinião a respeito de um evento, de algo que ele está estudando, a gente precisa diminuir a plataformização”, afirma. Renan concorda e ressalta que tais ferramentas tomam muito tempo e são desgastantes. 

Além disso, o cenário desigual da população também pode ser uma barreira para o uso de plataformas no ensino. “A gente precisa entender que há pessoas que podem ter crédito no celular, e pessoas que não podem, pessoas que podem ter [internet] wi-fi em casa, e outras que não, então é difícil para um professor cobrar de forma justa quando tem outros aspectos sociais que permeiam a questão da educação”, ressalta a professora. 

Ficha Técnica

Reportagem: Isadora Kovalczuk e Vitor Beninni 

Edição: Alice Lima e Ana Clara Osinski

Orientação: Cândida de Oliveira