Na manhã do dia 5 de dezembro teve início a 21ª Jornada de Agroecologia, evento de caráter político, educativo e cultural que reúne agricultores, estudantes, pesquisadores, movimentos sociais e lideranças para promover a agroecologia como alternativa ao modelo do agronegócio. A sustentabilidade no campo foi destaque na Conferência sobre a crise do sistema capitalista, suas consequências para a população, a natureza e os desafios para a classe trabalhadora. O evento reuniu mais de 500 trabalhadores do campo, vindos de diferentes regiões do Brasil, no auditório do campus Politécnico da Universidade Federal do Paraná.
O encontro contou com momentos culturais, como a execução do hino nacional ao som da viola, e debates sobre temas como o uso de agrotóxicos, a mais-valia e a remuneração do trabalho no Brasil. Marcado pela força simbólica das enxadas e foices empunhadas pelos participantes, o evento denunciou os impactos do modelo agrário predominante e clamou por mudanças urgentes em defesa dos direitos dos trabalhadores e do meio ambiente.
Entre o Capital e o Trabalhador
A mesa de debate contou com João Pedro Stédile, economista e membro da direção nacional do MST, e Sileuza Barreto, agricultora e militante pelo empoderamento de trabalhadoras do campo. Ambos trouxeram reflexões sobre a exploração do trabalhador no sistema capitalista, abordando a concentração de mercado e os três modelos de organização agrícola no país.
A ativista relatou como o norte do país passou a lidar com o crescimento das periferias e a superlotação das cidades. De acordo com Sileuza, jovens, muitas vezes sem alternativas, acabam se envolvendo com drogas e o crime, enquanto a fome atinge famílias que, iludidas por promessas vazias de prosperidade no agronegócio, abandonaram o cultivo no interior do Pará. “Faziam a promessa de que o agronegócio traria desenvolvimento para as comunidades, trabalho para a juventude e renda. Infelizmente, as pessoas, carentes de políticas públicas, caíram nessa cilada e venderam suas terras. Nós, enquanto movimento político, nos opomos a isso, entendendo que não era uma situação boa para o meio ambiente.”
Stédile cobrou justiça pelas mortes de trabalhadores na construção da usina de Itaipu, relembrando as condições de exploração daquele período. Representantes de movimentos de luta pela terra, incluindo da Bolívia, reforçaram a unidade internacional das lutas dos povos do campo. Sileuza relatou os impactos do agronegócio em Santarém, no Pará, onde a monocultura da soja destrói o solo, afeta a cultura local e prejudica a saúde dos moradores da região.
“É disso que se trata, ocupar também a universidade, para que ela contribua ativamente na resolução dos problemas enfrentados pela população e pela agricultura familiar”
João Pedro Stédile, economista e membro da direção nacional do MST
Distante do formato tradicional de seminários acadêmicos elitistas, a Jornada Agroecológica se consolidou como um espaço inclusivo de troca de saberes, onde brasileiros negros, trabalhadores rurais e indígenas dividiram suas vivências. Unidos por um propósito comum, eles reafirmaram a resistência ao avanço do agronegócio predatório e a luta por alternativas mais justas e sustentáveis para o campo e a sociedade. O economista aponta que o papel da Universidade é essencial para a construção da luta popular. “Já participei de muitas jornadas, mas, desde o início, esta iniciativa tem um valor fundamental para a agricultura familiar de todo o Brasil. Ela possui uma grande repercussão e uma característica marcante: tem os agricultores como público principal, trazendo para o debate os saberes populares e combinando-os com o conhecimento científico. É disso que se trata, ocupar também a universidade, para que ela contribua ativamente na resolução dos problemas enfrentados pela população e pela agricultura familiar”, destacou Stédile.
A Luta Continua
Com vozes e cantos que ecoaram força e resistência, o evento deixou uma mensagem contundente: a terra pede socorro, mas sua salvação depende da organização dos trabalhadores. É preciso plantar um futuro onde a solidariedade e a justiça prevaleçam sobre o lucro. Como diz o hino do Movimento Sem Terra cantado no encontro: “braços fortes que rasgam o chão, sob a sombra de nossa valentia, desfraldemos a nossa rebeldia e plantemos nesta terra como irmãos!”
Adelir dos Santos, de 35 anos, é uma das participantes da Jornada Agroecológica. Moradora do acampamento Maila Sabrina, localizado em Ortigueira, no norte do Paraná, ela vive a experiência pela primeira vez e destaca o impacto transformador da iniciativa. “Estou aprendendo muito, principalmente sobre a importância de cultivar de forma saudável e sustentável, longe dos venenos que prejudicam tanto a nossa saúde quanto a terra”, afirma Adelir, que vê no evento uma oportunidade de crescimento não apenas pessoal, mas também comunitário. Para ela, compreender as etapas de produção e distribuição dos alimentos é essencial para quem trabalha diretamente com a terra e com a comercialização de alimentos. “Para nós, que plantamos e vendemos comida, faz muita diferença saber como ela é feita e chega até as pessoas. Esse conhecimento valoriza o nosso trabalho e nos faz enxergar a importância de cuidar do que produzimos”, reflete.
O evento transmitiu uma mensagem de esperança e mobilização para um futuro agrícola baseado na solidariedade, na justiça social e na preservação ambiental, onde o trabalho e a terra se harmonizem para garantir um Brasil mais justo para as futuras gerações. A Jornada Agroecológica se consolidou como um espaço de ação e conscientização, onde o modelo agroecológico é apresentado como uma alternativa ao agronegócio predatório. Um momento de reafirmação de direitos, com foco na luta por um modelo que valorize a terra e os trabalhadores, garantindo sua participação ativa no processo de tomada de decisões sobre a agricultura e as políticas públicas relacionadas.
Ficha Técnica
Reportagem e Imagens: Vitória Smarci e Rodrigo Matana
Fotos: Vitória Smarci
Edição: Cândida de Oliveira