O mês passado trouxe intensas chuvas para diversas regiões da capital paranaense, as quais ainda lidam com os efeitos das tempestades. Entre os bairros afetados, Fanny e Parolin foram um dos que ficaram com ruas totalmente alagadas. Na tarde de 22 de novembro (quarta-feira), dia em que iniciou-se o mais recente temporal na cidade, o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) emitiu um alerta laranja para uma tempestade com raios e ventos de até 100 Km/h na capital. Com a previsão de 30 a 60 mm/h, o grande volume de água fez com que ruas ficassem inacessíveis para o trânsito de veículos e impediu que moradores entrassem ou saíssem das residências.
A chuva que começou por volta das 18h se estendeu de maneira intensa até 20h do dia 22, período que começou a encher os córregos da região. A falta de escoamento causado tanto pela falta de bueiros nos bairros, quanto pelo acúmulo de lixo e entulho, fez com que a água vinda de locais mais altos fosse parar nos rios Pinheirinho e Belém, onde ficam respectivamente os bairros Fanny e Parolin. Além do sobrecarregamento, outro problema encontrado é a canalização desses rios.
Moradores relataram que não é a primeira vez que esse problema acontece no bairro. Noeli Rodrigues, moradora há 40 anos do Fanny, diz que o problema das enchentes começou a ocorrer quando a prefeitura decidiu canalizar o rio que passa na frente da casa dela, o Rio Pinheirinho.
“Quando eles começaram a canalizar, aí que começou também o drama. Na minha casa já é a terceira vez que entra bastante água”.
Obra milionária da prefeitura iniciada em 2015, Curitiba Contra as Cheias , é um projeto criado para conter a vazão dos rios da cidade. Com um investimento inicial de cerca de 126 milhões de reais — valor que foi ultrapassado ao longo dos anos — a construção deveria ter sido entregue em 2017, mas até hoje está inacabada.
Projetada para melhorar o sistema de drenagem e controle dos riscos das cheias, ela abrange os córregos Santa Bernadethe, Henry Ford e Curtume e os rios Vila Guaíra e Pinheirinho, que deságuam no Rio Belém. Com cerca de oito quilômetros, ela compreende a implantação de muros de concreto para contenção de margens, indutores de retardo no fluxo da água, caixas de contenção, além de serviços contínuos de remoção de lixos e desassoreamento em todos os córregos. A moradora relata que depois que os responsáveis pela obra tiraram as árvores do local — na beira do rio — e colocaram “concreto”, todo o problema da região se intensificou.
Noeli conta que perdeu grande parte da mobília para as inundações, entre guarda-roupas, sofás, armários, e até a cama que estava pagando. O problema vai além da perda material, ela conta sobre seu desespero em relação aos cachorros que possui. “A água tava entrando e a gente tentando pegar eles […] o pequenininho eu até consegui pegar no colo, mas o grande eu não consegui.” O golden retriever chegou a pegar uma infecção na enchente que ocorreu no início deste ano.
O marido de Noeli, Celso de Paula Felicio, ao ser entrevistado por nossa equipe no dia do alagamento, questionou a falta de pessoas responsáveis pela obra no local na hora das chuvas.
“Hoje era para ter vindo alguém deles [prefeitura] aqui para ver como o povo fica, mas não, eles virão só amanhã.”
Os moradores revelam que já tiveram que ligar inúmeras vezes para 156 (Central de Atendimento da Prefeitura) para pedir uma solução para o problema, porém quase nunca foram atendidos. A moradora questiona a eficiência da prefeitura em lidar com as obras. “É fácil fazer uma maquete, desenhar e colocar água nela, agora quero ver viver isso aqui.”
Com as mudanças climáticas, esse tipo de problema acaba sendo cada vez mais frequente na cidade. A obra, que de início tinha uma boa intenção, acabou não acompanhando o crescimento e desenvolvimento urbano do bairro. Assim, um projeto que iria facilitar a vida dos moradores se tornou um transtorno em dias de muitas chuvas.