Nas últimas três legislaturas – 2016, 2020 e 2024 –, a Câmara Municipal de Curitiba (CMC) elegeu 114 vereadores. Desses, apenas 11 são pessoas negras. Proporcionalmente, apenas uma a cada dez pessoas eleitas para o cargo na capital é negra. Desde 2016, quando candidatos passaram declarar cor/raça ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), quase 90% das cadeiras foram ocupadas por pessoas brancas. Mais de 75% pertenceram a homens. Até a próxima eleição municipal de 2028, serão 12 anos de legislatura com apenas seis mandatos de pessoas pretas.
O Estatuto da Igualdade Racial, instituído pela lei 12.288, de 2010, considera pessoas negras as que se autodeclaram pretas ou pardas. Essa é a classificação usada pelo IBGE no Censo Demográfico, que, em 2022, apontou que 55,5% da população brasileira é negra.
Ainda de acordo com o Censo, Curitiba é a capital mais negra do Sul brasileiro. Vivem aqui quase 430 mil negros e negras, que representam 24% dos habitantes do município.
De 752 candidaturas a vereador em 2024, 198 eram de pessoas pretas ou pardas, 26% do total. Nas urnas, a proporção é diferente: apenas 15% dos votos válidos do eleitorado curitibano foram em candidatas ou candidatos negros.
Ao cruzar os dados eleitorais do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), é possível compreender melhor como a população curitibana vota. Na divisão por bairros, algumas regiões se destacam pela votação em pessoas negras, como os bairros Parolin e São Miguel. Por outro lado, os bairros Mossunguê, Butiatuvinha e Santo Inácio, regiões nobres da cidade, não atingem 9% de votos em candidaturas negras.
Os bairros Mossunguê (Ecoville), Butiatuvinha e Santo Inácio, considerados nobres, não atingem 9% de votos em pessoas negras.
O maior índice de votação em candidatas ou candidatos negros é do Parolin, com 44%. Em seguida, está São Miguel, com 30,1%. Nos bairros São Braz e Cajuru, 28,2% e 25,9% dos votos, respectivamente, foram em pessoas pretas ou pardas.
A partir o mapa, é possível perceber que bairros periféricos da região sul, sudoeste e centro-oeste de Curitiba votaram mais em pessoas negras. Bairros considerados nobres da região norte, com exceção do centro, votaram menos em vereadores pretos e pardos.
Separamos a tabela completa com os dados de cada um dos bairros da cidade de Curitiba. Ela está disponível aqui, juntamente com os scripts de análise dos dados e demais arquivos.
As representantes pretas na Câmara
Na CMC, a representação da bancada negra está menor que em 2020: 5% da próxima gestão. As duas únicas pessoas pretas eleitas para a 19ª Legislatura da Câmara Municipal, ambas mulheres, são Giorgia Prates Mandata Preta (PT) e Vanda de Assis (PT).
Prates foi eleita para o segundo mandato, com 6.070 votos – número 70% maior do que no pleito de 2020, quando ocupou a terceira suplência do Partido dos Trabalhadores na casa. “É um cenário muito ruim porque a gente sabe a dificuldade prática que a falta de representatividade traz”, afirma.
A vereadora tomou posse do primeiro mandato após as Eleições Gerais de 2022, quando Carol Dartora (PT) e Renato Freitas (PT) – dois dos únicos três vereadores negros eleitos para a CMC em 2020 – renunciaram as cadeiras na Câmara para assumir os cargos de deputada federal e deputado estadual, respectivamente. “A consequência real da falta de representatividade é a dificuldade efetiva que a gente tem em fazer as políticas públicas acontecerem para quem precisa”, aponta.
Para Giorgia Prates, o baixo índice de pessoas negras eleitas no município, para além da baixa representatividade, é obstáculo à própria democracia. “Acaba rolando uma inversão: a política, que existe para atender os mais vulneráveis, fica a serviço dos mais abastados”, diz.
“A política, que existe para atender os mais vulneráveis, fica a serviço dos mais abastados”.
Giorgia Prates (PT), vereadora reeleita
Perfil da periferia
Candidata pelo PT, Vanda de Assis foi eleita neste ano para o primeiro mandato como vereadora na Câmara Municipal de Curitiba, com 5.006 votos. Assistente social e integrante do Conselho Permanente de Direitos Humanos (COPEDH/PR), ela dá destaque à presença da população negra na capital paranaense. “A cidade da propaganda pode se mostrar branca, mas a periferia é composta por mulheres e homens negros e negras”.
As regiões periféricas e menos valorizadas pelo governo municipal, como apontam os dados do TSE, representam os maiores índices de votação em pessoas negram para o poder legislativo de Curitiba. “Lá na periferia, é muito difícil encontrar um grupo que não seja formado em maioria por mulheres negras”.
“A cidade da propaganda pode se mostrar branca, mas a periferia é composta por mulheres e homens negros e negras”.
Vanda de Assis (PT), vereadora eleita
Ficha técnica
Reportagem: Giovani Sella e Rodrigo Matana
Edição: Giovani Sella e Rodrigo Matana
Supervisão: Cândida de Oliveira