O Centro de Referência Paralímpico (CRP), inaugurado em 27 de agosto deste ano e localizado no Setor de Educação Física da Universidade Federal do Paraná (UFPR), é fruto de uma parceria entre a UFPR, a Secretária Estadual do Esporte e o Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB). O centro faz parte de um projeto nacional do CPB, com o objetivo de oferecer modalidades paralímpicas em estados de todas as regiões do Brasil.
Utilizando a infraestrutura da universidade, o CRP de Curitiba oferece quatro modalidades paralímpicas: tênis de mesa em cadeira de rodas, parabadminton, goalball e atletismo. Os treinos ocorrem pela manhã e à tarde e o centro busca atender crianças e jovens (7 a 17 anos), independente do nível de habilidade. A iniciativa atua na tentativa de fornecer espaços de formação e desenvolvimento de novos talentos no esporte paralímpico. O centro surge, também, como uma forma de avaliar se, para além de grandes competições como as Paraolimpíadas, existe uma inclusão real dos jovens atletas no esporte.

Dificuldades à inclusão
Atendendo cerca de 40 jovens, a professora Ana Claudia Osiecki, coordenadora do centro, explica que, além do preconceito sofrido pelos paratletas, lacunas em termos de acessibilidade e visibilidade dificultam a inserção de pessoas com deficiência (PCD) no esporte e crescimento do centro. O projeto está em um momento de captação de atletas, com parcerias que apoiam a infraestrutura e material usados, porém a falta de divulgação, segundo a coordenadora, dificulta o avanço.
Além dos desafios de visibilidade, os profissionais que atuam no CRP de Curitiba também apontam dificuldades cotidianas para garantir que os atletas tenham acesso aos recursos necessários. Kevin Lima, que atua com o esporte paralímpico há mais de 10 anos e dá aulas de atletismo no centro, destaca a importância da equipe interdisciplinar, mas também aponta a necessidade de melhorias em certas áreas. O professor destaca o trabalho que tem se desenvolvido no centro, mas afirma que o acesso aos atletas e o investimento em locomoção e transporte para facilitar que eles venham à pista ainda é um desafio.

Ellen K.C Rank é atleta e mãe de Gabriel, 15 anos, e Matheus, 13. Seus dois filhos são autistas e treinam no CRP de Curitiba. Ellen conheceu a iniciativa por meio do Instituto São José de Paradesportos, em São José dos Pinhais. O CRP, para ela, garantiu um espaço adequado de treino para os filhos. “A gente vem para mostrar eles têm capacidade também, o que vai contra o que a sociedade fala”, ressalta.
Embora Gabriel e Matheus treinem no centro, existem grandes falhas em competições escolares, por exemplo, e em categorias específicas, como a de autismo. “Eles tentaram se inscrever nos Jogos Escolares do Paraná, mas não há uma categoria para autistas. Há tanto tempo que o autismo já é divulgado, e eles não criaram um regulamento”, expõe. A mãe também observa a divulgação escassa de eventos paralímpicos. A falta de atletas quase levou ao cancelamento de competições como os Jogos Paradesportivos do Paraná 2024 (Parajaps). Para Ellen a inclusão é fraca e precisa de mais investimentos.

Outro desafio enfrentado pela família é a logística do deslocamento. Eles moram no boqueirão, bairro localizado a mais de 12 Km do CRP, mas a qualidade do atendimento os motiva. O apoio dos profissionais do centro faz toda a diferença para Ellen que vê grande resultados para os filhos, com Gabriel possivelmente competindo no Parajaps 2025. “Pelo que falaram, ele já consegue troféu. Já está correndo mais rápido que eu”, se orgulha.
Para além do pódio
Com uma longa trajetória no esporte paralímpico, o professor Raul Osiecki dedicou sua carreira a promover a inclusão por meio do esporte. Ele conheceu o trabalho na Universidade Federal do Paraná (UFPR) ainda nos anos 1990, como aluno, quando foi treinar uma equipe de corredores deficientes visuais. Raul foi campeão brasileiro duas vezes na modalidade e convocado para ser técnico da Seleção Brasileira Paralímpica de Atletismo de Deficientes Visuais nos Jogos Paralímpicos de Seul. Na ocasião, a equipe trouxe sete medalhas para o Brasil. Foi a partir dessa experiência que ele se envolveu diretamente na criação do Centro de Referência Paralímpico de Curitiba.
“O que eu mais quero não é uma medalha. O que eu mais quero é ver esse cara na universidade”
– Raul Osiecki, professor da UFPR e idealizador do CRP de Curitiba
A iniciativa do CRP também é uma parceria entre treinador e atleta. O projeto de Raul foi escrito com apoio de Mário Sérgio Fontes, seu antigo paratleta e atual Coordenador Técnico do Departamento do Paradesporto da Secretaria do Estado do Esporte do Paraná. O objetivo foi construir um projeto que pudesse atender a comunidade e promover a iniciação desportiva também para as crianças. O centro integra o projeto nacional do CPB, mas, para tirar a ideia do papel, Osiecki relembra os desafios enfrentados. “O projeto não andava, a gente pegou um ônibus aqui à noite, de próprio recurso, e foi lá para São Paulo e conversou com o pessoal do comitê. E aí a coisa começou a andar. E esse ano a gente conseguiu efetivar o Centro de Referência Paralímpico aqui.”

Para ele, o centro representa muito mais do que a formação de atletas de alto rendimento. O verdadeiro legado está na formação integral dos jovens, preparando-os não só para competições esportivas, mas para uma vida de oportunidades acadêmicas e profissionais. “Eu quero que o garoto, a garota, entre aqui com idades iniciais e possam sair daqui dentro de uma universidade. Que a gente possa proporcionar essa formação também. O que eu mais quero não é uma medalha. O que eu mais quero é ver esse cara na universidade “, ressalta Raul. Ana Cláudia Osiecki também destaca essa visão integrada. Segundo ela, o objetivo é promover qualidade de vida e bem-estar para crianças e adolescentes com deficiência.

Ficha Técnica
Reportagem: Sophia Martinez
Edição: Alana Morzelli
Orientação: Cândida de Oliveira