Quem anda pelo centro de Curitiba nota os pixos nos prédios da cidade, geralmente espalhados no alto dos edifícios, o que dificulta sua identificação, mas mesmo assim, não passam despercebidos. O pixo pode ser definido como o ato atribuído à ação de pintar com tinta spray paredes e muros. A vertente mais aceita é o grafite, que se assemelha na prática, porém possui uma estética mais “amigável”. 

Com base no senso comum, muitas pessoas associam o pixo ao vandalismo, considerando a prática marginal e desrespeitosa, e seguidamente realizam movimentos para cobrir e inibir esse tipo de manifestação. Por outro lado, o pixo é usado por diversas pessoas e grupos como forma de expressão e coletividade.  

Acredita-se que sua origem vem dos alfabetos da Europa antiga encontrado em runas abandonadas, inspirando assim um movimento baseado na escrita de povos que existiram há séculos. Entretanto, essa teoria gera dúvidas visto que a cultura da pixação despensa a documentação, o que dificulta seu estudo por parte do público “não-pichador”.  


O pixo se molda aos prédios, criando um alfabeto singular e sua própria identidade estética, ultrapassa a ideia de vandalismo para torna-se uma forma de revolução de cunho político. Nessa perspectiva, não há preocupação com o formato da letra. O que importa é passar uma mensagem, como ocorreu durante a ditadura militar no Brasil, onde estudantes escreviam mensagens contra a repressão policial.  

Jovem picha a fachada do Teatro Municipal
Jovem picha a fachada do Teatro Municipal do Rio durante a passeata de 26 de junho de 1968. Foto: Kaoru/CPDoc

Há aqueles que buscam uma forma de protestar contra as desigualdades sociais, a violência, a falta de oportunidades e outros problemas urbanos decorrentes da invisibilidade da periferia, mas os motivos incluem também questões de expressão pessoal e identidade, numa busca de afirmação e uma forma de se conectar com determinado grupo social.  

Para além das mensagens, há grupos que utilizam os espaços para deixar uma “marca” pela cidade, geralmente com tags de identificação criada a partir de um processo criativo. Após a criação de tag que identifica o grupo, a intenção é ocupar o maior número de espaços possíveis.  

O pixo é uma prática complexa que não pode ser reduzida a uma única explicação, sendo destinta até mesmo na palavra escrita. Pixo, com “X”, diz respeito a demarcação territorial e desafio às autoridades, sendo menos aceito pela sociedade. Já picho, com “CH”, traz mensagens poéticas, contestantes, e com letras mais simples e menos elaboradas, geralmente é a forma socialmente mais aceita.  

Crime ou Manifestação? 

Segundo o artigo 163 do Código Penal, a pichação é considerada um ato de vandalismo e crime ambiental, sendo passível de multa por dano ao patrimônio privado ou público. A pena para quem pratica pixação pode variar, mas geralmente corresponde a detenção de três meses a um ano, além de o imputado ser responsabilizado a pagar uma multa correspondente ao local da pichação, sendo um valor ainda mais elevado se for em um prédio público, monumento histórico ou propriedade privada.  

A pichação em Curitiba, assim como em outras cidades, é considerada uma infração e pode acarretar diversas penalidades. A legislação municipal e estadual, em conjunto com o Código Penal, define as punições para esse tipo de ato com multa e prestação de serviços à comunidade. No geral, a multa por pichação varia de cidade para cidade no Brasil, algumas possuem legislações mais severas e os valores podem ser ainda mais altos. Muitos contestam essa medida, ponderando o que realmente é crime ambiental, visto que o pixo não necessariamente prejudica o espaço territorial de determinada região. 

Há quem interessa a arte marginal? 

O artista Hélio Oiticica é autor de uma frase famosa: “Seja marginal, seja herói”. Para ele, a palavra “marginal” não deve ser atribuída a alguém que está às margens da sociedade, mas a alguém que se coloca à margem dos padrões estabelecidos, que questiona as normas dominantes do sistema capitalista, fomentando uma atitude de resistência. O herói, na visão do artista, é reinterpretado e passa a ser compreendido como alguém que rompe com as convenções e que decide buscar pela liberdade e autenticidade.  

Segundo o pichador e grafiteiro Ark, o pixo é um elemento comum da cidade de Curitiba. Em defesa da prática, ele conta sua relação com o movimento, “Eu vou e pixo um muro, o muro vai continuar lá, cumprindo a função dele que é de proteger algo, não é de fato um vandalismo transformar a estética dele. A diferença da pixação é que apesar de ser apenas um elemento estético, é algo que consegue agredir, incomodar. Na realidade é tinta na parede.”  

A fala de Ark e a frase de Hélio Oiticica representam um chamado para que as pessoas encontrem a própria voz e lutem por seus ideais. O grafiteiro conta sua relação com a arte e a cidade. “Também faço parte da cidade, observo e, mais intensamente, prático. Antes mesmo de pixar já me atentava para isso, houve coisas escritas em muros que me marcaram já desde cedo, sem entender direito o que significava.” 

Prédios abandonados, como na Rua Presidente Faria, são espaços atrativos ao pixo. Foto: Thais Castro

O centro de Curitiba passa frequentemente por mudanças, seja nas diversas lojas que abrem e fecham ou no processo de resgate dos prédios abandonados. Vaga espaços em branco, a revolução do pixo se esbeiça pelas esquinas, ruas e avenidas, se manifesta de forma diferente, não pede permissão, ocorre sem aviso prévio, contestando a proibição.